Pornografia de Vingança: Uma das Formas de Abuso Sexual Baseado em Imagens

Introdução

A pornografia de vingança, ou revenge porn, é um fenômeno que ganhou destaque com a ascensão das tecnologias digitais e das plataformas de mídia social, emergindo como uma prática preocupante no campo da criminologia digital. Este tipo de comportamento envolve a divulgação não consensual de imagens ou vídeos de cunho sexual, geralmente com a intenção de causar constrangimento, humilhação ou sofrimento à vítima. A prática, que muitas vezes ocorre após o término de relacionamentos íntimos, reflete dinâmicas de poder, controle e violência psicológica, frequentemente amplificadas pela facilidade de disseminação proporcionada pelo ambiente digital. No contexto da criminologia digital, a pornografia de vingança é analisada não apenas como uma infração legal, mas também como uma forma de violência que intersecta questões de gênero, privacidade, ética e segurança cibernética.

A pornografia de vingança é então definida como a publicação ou distribuição eletrônica de material sexual explícito sem o consentimento da pessoa retratada, frequentemente acompanhada por informações pessoais, como nome completo, endereço ou perfis de redes sociais (Jahankhani, 2018). Diferentemente da pornografia não consensual, que engloba uma gama mais ampla de delitos, como voyeurismo tecnológico ou hacking, a pornografia de vingança é caracterizada por sua natureza retaliatória, geralmente associada ao término de um relacionamento amoroso, onde imagens originalmente compartilhadas de forma consensual são usadas como arma para infligir dano emocional. Esse fenômeno, embora não seja novo em sua essência, foi intensificado pela disseminação das redes sociais, que permitem a rápida propagação de conteúdos em escala global. Plataformas como Facebook, X, Instagram e outras, que surgiram a partir da década de 2000, facilitam a troca de informações, mas também criam vulnerabilidades, permitindo que conteúdos sensíveis sejam compartilhados sem controle (Jahankhani, 2018). A facilidade de acesso e a anonimidade parcial proporcionada pelo ambiente digital amplificam os impactos psicológicos e sociais sobre as vítimas, que podem sofrer humilhação pública, estigmatização e danos à reputação pessoal e profissional.

No contexto legal, a pornografia de vingança apresenta desafios significativos, especialmente devido à complexidade do quadro jurídico que tenta abordar esse tipo de comportamento. No Reino Unido, por exemplo, antes de 2015, casos de pornografia de vingança eram processados sob legislações existentes, como a Communications Act 2003 e a Malicious Communications Act 1988, que criminalizam comunicações ofensivas, ameaçadoras ou indecentes. No entanto, essas leis não foram originalmente desenhadas para lidar com a especificidade do ambiente digital e da disseminação de imagens sexuais, o que resultava em lacunas na proteção das vítimas. Em resposta a essa necessidade, a Criminal Justice and Courts Act 2015 introduziu, a partir de 13 de abril de 2015, uma legislação específica (Seção 33) que criminaliza a divulgação de fotografias ou vídeos sexuais privados sem consentimento, com pena máxima de até dois anos de prisão. Essa lei considera material sexual não apenas imagens que mostram genitais, mas também qualquer conteúdo que uma pessoa razoável consideraria sexual, como poses provocativas ou comportamentos explícitos (Jahankhani, 2018). Apesar de ser um avanço, a legislação enfrenta críticas por sua limitação, especialmente em relação à exigência de provar a intenção de causar sofrimento. A Seção 33(8) já então estabelece que a intenção de causar sofrimento não pode ser presumida apenas porque o ato foi uma consequência natural e provável da divulgação, o que restringiria a aplicação da lei a casos em que a motivação retaliatória estaria explícita, deixando de fora situações motivadas por ganhos financeiros, prazer sexual ou simples brincadeira (Phippen & Agate, 2015).

Do ponto de vista criminológico, a pornografia de vingança pode ser analisada através de teorias que explicam o comportamento criminoso no ambiente digital. A Space Transition Theory sugere que o comportamento criminoso no ciberespaço é influenciado pela transição entre os mundos físico e virtual, onde a ausência de barreiras geográficas e a percepção do anonimato incentivam ações que talvez não fossem realizadas offline (Jahankhani, 2018). Essa teoria é particularmente relevante para entender por que indivíduos que compartilham imagens íntimas sem consentimento podem sentir-se menos inibidos no ambiente digital. Além disso, a pornografia de vingança frequentemente reflete dinâmicas de poder e controle, especialmente em contextos de violência de gênero. Estudos apontam que a maioria das vítimas são mulheres, e a prática está frequentemente vinculada a relações de poder desiguais, onde o agressor utiliza a exposição de imagens como uma forma de controle ou retaliação (Salter, 2017). A interseção entre violência online e offline também é significativa, já que a pornografia de vingança pode ser uma extensão de abusos como violência doméstica ou assédio, tornando a distinção entre os dois âmbitos cada vez menos relevante.

As práticas associadas à pornografia de vingança também estão ligadas a fenômenos como o sexting e a sextortion. O sexting refere-se ao compartilhamento de imagens ou vídeos explícitos entre indivíduos, muitas vezes de forma consensual, mas que podem ser usados posteriormente de maneira não consensual. Quando essas imagens são usadas para coagir ou extorquir as vítimas, como no caso de webcam blackmail, surge o fenômeno da sextortion, onde os agressores ameaçam divulgar as imagens a menos que sejam atendidas demandas financeiras e/ou sexuais (Jahankhani, 2018). Esses comportamentos são frequentemente perpetrados por redes criminosas organizadas, que operam de maneira sofisticada, utilizando plataformas de redes sociais, sites de namoro ou até mesmo sites de pornografia para atrair vítimas (Interpol, n.d.). No contexto do sexting envolvendo menores de idade, surgem questões adicionais, já que imagens de pessoas menores de 18 anos podem configurar crimes adicionais sob legislações como a Protection of Children Act 1978 no Reino Unido, que criminaliza a posse ou distribuição de imagens indecentes de menores (Jahankhani, 2018). A complexidade desses casos exige uma abordagem diferenciada, especialmente quando os perpetradores são jovens e residentes de países civilizados, já que a aplicação de penas severas, como o registro em listas de criminosos sexuais, pode ter consequências densas (Phippen & Agate, 2015).

Os desenvolvimentos recentes no combate à pornografia de vingança incluem avanços legislativos, tecnológicos e educacionais. Além da introdução de legislações específicas, como as mencionadas no Reino Unido, há esforços para harmonizar abordagens legais em escala global, reconhecendo a natureza transnacional do crime digital. A cooperação internacional é essencial, já que vítimas, perpetradores e plataformas podem estar hospedados em diferentes localizações geográficas, criando desafios jurisdicionais significativos. Em termos tecnológicos, plataformas de mídia social têm implementado medidas para detectar e remover conteúdo não consensual, embora essas iniciativas ainda enfrentem limitações devido ao volume massivo de dados e à sofisticação dos métodos usados pelos agressores. No campo educacional, programas de conscientização têm sido propostos para aumentar a compreensão dos riscos associados ao compartilhamento de imagens íntimas e promover comportamentos seguros no ambiente digital. No entanto, a eficácia dessas iniciativas depende da implementação contínua e da adaptação às mudanças tecnológicas frenéticas (Jahankhani, 2018).

As precauções para mitigar a pornografia de vingança envolvem uma abordagem multifacetada, que combina medidas legais, tecnológicas e educativas. Do ponto de vista legal, é crucial que as legislações sejam atualizadas para acompanhar a evolução tecnológica e abordar as lacunas existentes, como a necessidade de provar intenção específica. A simplificação e clarificação das leis, como sugerido no documento, poderiam reduzir a subjetividade nas decisões judiciais e garantir maior proteção às vítimas (Jahankhani, 2018). Isso significa que a dita “letra da Lei” deve ser clara (In claris cessat interpretatio). Tecnologicamente, o desenvolvimento de ferramentas de inteligência artificial para identificar e remover rapidamente conteúdos não consensuais é uma prioridade, assim como a implementação de políticas robustas por parte das plataformas digitais para prevenir a disseminação de tais conteúdos. No entanto, a tecnologia por si só não é suficiente. A educação e a conscientização pública desempenham um papel central na prevenção. Programas que promovam a alfabetização digital, especialmente entre jovens, podem ajudar a reduzir a vulnerabilidade ao ensinar práticas seguras, como evitar o compartilhamento de imagens sensíveis e reconhecer sinais de manipulação online (Phippen & Agate, 2015). Além disso, o apoio às vítimas deve ser fortalecido, com serviços que ofereçam assistência psicológica, jurídica e tecnológica para mitigar os danos causados.

A pornografia de vingança é um problema complexo que reflete os desafios mais amplos da criminologia digital, incluindo a intersecção entre tecnologia, comportamento humano e sistemas legais. Sua análise exige uma compreensão profunda das dinâmicas de poder, das vulnerabilidades criadas pelo ambiente digital e das limitações das estruturas legais atuais. Embora avanços legislativos, como a Criminal Justice and Courts Act 2015 no Reino Unido, representem um passo importante, a natureza transnacional e multifacetada do crime exige esforços contínuos em cooperação internacional, inovação tecnológica e educação. A prevenção da pornografia de vingança e a proteção das vítimas dependem de uma abordagem integrada que combine rigor legal, avanços tecnológicos e conscientização pública, garantindo que o ambiente digital seja um espaço seguro e ético para todos.

Estimativas de Prevalência das Ocorrências da Pornografia de Vingança

Não é nada fácil determinar com precisão a prevalência das ocorrências de revenge porn, dada a falta de denúncias realizadas pelas vítimas. Manchadas pela vergonha, aviltadas nos seus aspectos mais íntimos, cientes do desrespeito vil e da falta de suporte jurídico minimamente decente, as vítimas deixam de fazer as suas denúncias, convivendo dias, semanas e anos com uma das mais profundas dores do humano: o estigma.

Apesar disso, as estimativas que temos sobre a prevalência da pornografia de vingança, também referida como uma das formas do abuso sexual baseado em imagens (IBSA), revelam a extensão significativa desse fenômeno nocivo em diversas populações, com impactos profundos nas vítimas. Estudos empíricos conduzidos em diferentes contextos globais, especialmente na Austrália, Estados Unidos e Reino Unido, indicam que a prática afeta uma proporção considerável de indivíduos, com variações de acordo com gênero, idade, orientação sexual, etnia e outras características demográficas. Essas estimativas são fundamentais para compreender a magnitude do problema e orientar políticas públicas, reformas legislativas e estratégias de prevenção.

Na Austrália, uma pesquisa nacional conduzida por Henry, Flynn e Powell (2019) revelou que aproximadamente um em cada cinco indivíduos (23%) com idades entre 16 e 49 anos relatou ter sido vítima de pelo menos uma forma de abuso sexual baseado em imagens IBSA. As formas mais comuns incluíram a captura não consensual de imagens nuas ou sexuais, relatada por 20% dos participantes, e a distribuição não autorizada dessas imagens, mencionada por 11%. Além disso, 9% dos entrevistados afirmaram ter sofrido ameaças de distribuição de imagens íntimas. Esses dados foram corroborados por um estudo representativo da população australiana, encomendado pelo Office of the eSafety Commissioner (OeSC, 2017), que encontrou uma prevalência semelhante de 11% para a distribuição não consensual de imagens nuas ou sexuais. A pesquisa de Henry et al. (2019) também destacou que certas populações são desproporcionalmente afetadas: 50% dos aborígines e insulanos do Estreito de Torres, 50% das pessoas com deficiência, 33% das pessoas lésbicas, gays ou bissexuais e 33% dos jovens de 16 a 19 anos relataram vitimização por IBSA. Esses números indicam que grupos marginalizados e minoritários enfrentam riscos significativamente maiores, o que pode ser atribuído a fatores como discriminação, vulnerabilidade social e dinâmicas de poder desiguais.

Em relação à perpetração, o mesmo estudo australiano apontou que 10% dos entrevistados admitiram ter praticado pelo menos um comportamento relacionado ao IBSA. Desses, 9% confessaram ter capturado imagens nuas ou sexuais sem permissão, enquanto 7% relataram distribuí-las sem consentimento. Homens apresentaram taxas de perpetração mais altas (14%) em comparação com mulheres (7%), com picos entre homens de 20 a 29 anos (18%) e 30 a 39 anos (16%). Entre as mulheres, a perpetração foi mais comum em faixas etárias mais jovens, como 16 a 19 anos (9%) e 20 a 29 anos (9%). Esses dados sugerem que, embora homens sejam os principais perpetradores, mulheres mais jovens também participam dessas práticas, possivelmente influenciadas por contextos sociais ou relacionais específicos. A pesquisa também revelou que os perpetradores frequentemente conhecem suas vítimas, com 24% dos casos envolvendo parceiros ou ex-parceiros, 20% familiares e 17% amigos, destacando o caráter relacional de muitos incidentes de IBSA.

Nos Estados Unidos da América, estudos como o de Lenhart, Ybarra e Price-Feeney (2016) estimaram que 3% das mulheres e 2% dos homens acima de 15 anos sofreram a postagem não consensual de imagens íntimas online. Jovens adultos de 18 a 29 anos apresentaram taxas mais altas (5%), com indivíduos lésbicas, gays ou bissexuais (15%) sendo significativamente mais afetados do que heterossexuais (7%). Outro estudo, conduzido pela Cyber Civil Rights Initiative (CCRI, 2014), examinou os impactos emocionais da vitimização, mas também forneceu insights sobre prevalência, indicando que a prática é comum em amostras não representativas, como estudantes universitários. Esses estudos sugerem que a prevalência pode variar entre 1% e 12% para a distribuição não consensual de imagens, dependendo da metodologia, definição de IBSA e características da amostra.

No contexto internacional, pesquisas sobre sexting não consensual oferecem pistas adicionais. Por exemplo, Crofts, Lee, McGovern e Milivojevic (2015) encontraram que 20% dos jovens australianos mostraram uma imagem sexual sem consentimento, enquanto 6% a enviaram a terceiros. Em um estudo italiano, Morelli et al. (2016) relataram que 13% dos jovens de 13 a 30 anos compartilharam imagens sexuais sem permissão. Essas taxas variam devido a diferenças em instrumentos de pesquisa e definições de “compartilhamento”, mas apontam para uma prevalência significativa de comportamentos relacionados ao IBSA, especialmente entre jovens.

A prevalência de ameaças de distribuição, conhecidas como sextortion, também é notável. Powell e Henry (2017) relataram que 10% dos australianos entrevistados sofreram ameaças de compartilhamento de imagens íntimas, sem diferenças significativas por gênero. Nos Estados Unidos, Lenhart et al. (2016) encontraram taxas mais baixas, com 4% das mulheres e 2% dos homens relatando ameaças de postagem de imagens para causar humilhação. Jovens mulheres menores de 30 anos (10%) e indivíduos LGBTQIA+ (15%) foram os mais afetados. Wolak e Finkelhor (2016) observaram que, em cerca de 30% dos casos de sextortion, as imagens foram efetivamente disseminadas, ampliando o impacto sobre as vítimas.

Essas estimativas de prevalência sublinham a necessidade de abordagens multifacetadas para enfrentar o IBSA. A alta incidência em grupos vulneráveis, como indígenas, pessoas com deficiência e comunidades LGBTQIA+, aponta para a importância de políticas inclusivas que considerem interseccionalidades de gênero, raça, sexualidade e deficiência. Além disso, as taxas de perpetração, especialmente entre homens jovens, sugerem a necessidade de campanhas educativas focadas em consentimento e responsabilidade digital. A prevalência significativa de atitudes de culpabilização da vítima, conforme identificado por Henry et al. (2019), com 50% dos homens e 30% das mulheres minimizando os danos ou responsabilizando as vítimas, reforça a urgência de intervenções culturais para combater narrativas que perpetuam a violência baseada em imagens.

Fatores Preditivos do Abuso Sexual Baseado em Imagens Íntimas

Os fatores preditivos do comportamento de exposição não consensual de imagens íntimas, conhecido como pornografia de vingança ou também abuso sexual baseado em imagens, abrangem uma complexa interação de características demográficas, traços de personalidade, atitudes e contextos sociais.

Estudos recentes, como o conduzido por Karasavva e Forth (2022), têm explorado essas variáveis para identificar os elementos que aumentam a probabilidade de perpetração desse tipo de violência sexual facilitada por tecnologia. Compreender esses fatores é essencial para desenvolver estratégias de prevenção, intervenções educativas e políticas públicas que abordem as raízes do problema e mitiguem seus impactos devastadores nas vítimas.

Entre os fatores demográficos, o gênero desempenha um papel significativo, embora os resultados sejam mistos. Karasavva e Forth (2022) encontraram que, embora o gênero não tenha sido um preditor independente de perpetração de IBSA em sua análise de regressão logística, 75% das vítimas identificaram seus perpetradores como homens. Esse achado é consistente com pesquisas anteriores, como a de Powell et al. (2019), que indicou que homens australianos eram 78% mais propensos a se envolver em comportamentos de IBSA em comparação com mulheres. Essa predominância masculina pode estar ligada a motivações de gênero específicas, como a busca por atenção ou validação social, frequentemente associadas à hipermasculinidade, conforme sugerido por Henry e Flynn (2019). Eles argumentam que a disseminação de imagens íntimas de mulheres por homens heterossexuais pode funcionar como uma forma de consolidação da masculinidade em espaços online, como sites dedicados a IBSA, onde a postagem de imagens masculinas é muitas vezes proibida. Contudo, Clancy et al. (2020) destacam que mulheres também perpetram IBSA, frequentemente motivadas por razões como “ridicularização” ou “fofoca”, utilizando canais mais privados, como aplicativos de mensagens instantâneas, o que sugere diferenças de gênero nas formas e intenções de perpetração. Essas discrepâncias sublinham a necessidade de investigações adicionais sobre como as motivações de gênero influenciam os métodos de disseminação.

A orientação sexual também emerge como um fator relevante, particularmente para a vitimização, mas menos para a perpetração. Karasavva e Forth (2022) relataram que participantes heterossexuais eram 35% menos propensos a sofrer vitimização por IBSA em comparação com indivíduos da comunidade LGBTQIA+. Esse achado está alinhado com estudos anteriores, como Powell et al. (2020), que indicaram taxas mais altas de vitimização entre pessoas LGBTQIA+. Uma possível explicação é a maior prevalência de sexting (envio consensual de imagens sexuais) entre indivíduos LGBTQIA+, conforme apontado por Dir et al. (2013) e Ouytsel et al. (2019), o que pode aumentar a vulnerabilidade à disseminação não consensual. No entanto, a ausência de associação significativa entre orientação sexual e perpetração sugere que os fatores motivacionais para IBSA podem ser mais universais ou influenciados por outras variáveis, como traços de personalidade ou atitudes.

Os traços de personalidade, particularmente os agrupados na Tétrade Negra ou Quadrilátero Sombrio (narcisismo, maquiavelismo, psicopatia e sadismo), são fortes preditores de perpetração de IBSA. Karasavva e Forth (2022) encontraram que narcisismo e sadismo foram preditores significativos de disseminação não consensual de imagens íntimas. Indivíduos com traços narcisistas, caracterizados por uma necessidade incessante de atenção e falta de empatia, podem ver a disseminação de imagens como uma forma de obter validação social ou exercer poder sobre os outros. Da mesma forma, traços sádicos, associados ao prazer em causar sofrimento, podem motivar a perpetração como uma forma de humilhação intencional. A psicopatia, embora correlacionada positivamente com a perpetração, não foi um preditor independente na análise de regressão, possivelmente devido à sobreposição com outros traços da Tétrade Negra. Surpreendentemente, o sadismo também foi associado à vitimização, o que Karasavva e Forth (2022) atribuem a comportamentos de risco online, como sexting ou envio de imagens explícitas não solicitadas, que podem expor indivíduos sádicos à retaliação ou disseminação não consensual. O maquiavelismo, por outro lado, não apresentou correlação significativa com a perpetração, possivelmente devido a limitações nas medidas atuais, que tendem a confundir maquiavelismo com psicopatia, como sugerido por Miller et al. (2019).

As atitudes também desempenham um papel crucial na predição da perpetração de IBSA. Karasavva e Forth (2022) identificaram correlações positivas entre perpetração e atitudes de aceitação dos mitos relacionados ao IBSA, bem como sentimentos de direito sexual e direito agravado. A aceitação de mitos, como a crença de que as vítimas são responsáveis por sua vitimização ou que a disseminação de imagens é inofensiva, pode racionalizar o comportamento dos perpetradores, reduzindo a culpa associada, conforme observado por Mckinlay e Lavis (2020). Embora a aceitação de mitos tenha se aproximado da significância estatística como preditor independente, sua influência é clara em estudos anteriores, como Powell et al. (2019), que encontraram que um aumento na pontuação de culpa no Sexual Image-based Abuse Myth Acceptance (SIAMA) estava associado a um aumento de 15% na probabilidade de perpetração. O direito sexual, definido como a crença de que se tem direito a favores sexuais independentemente do consentimento do parceiro, e o direito agravado, caracterizado por sentimentos de humilhação e raiva quando benefícios percebidos como “de direito” são negados, também foram correlacionados com a perpetração. Esses sentimentos de direito podem ser amplificados em espaços online, como a “manosfera”, onde a disseminação de imagens íntimas é justificada como uma resposta à suposta perda do poder masculino, conforme discutido por DeKeseredy e Schwartz (2016).

Um aspecto notável é a relação bidirecional entre vitimização e perpetração. Karasavva e Forth (2022) observaram que 28% das vítimas de IBSA também relataram ter perpetrado, e 57% dos perpetradores relataram ter sido vítimas, sugerindo uma dinâmica de “vítima-perpetrador” semelhante à observada em casos de bullying. Essa sobreposição pode refletir ciclos de retaliação ou contextos relacionais complexos, onde indivíduos que sofreram IBSA podem recorrer à disseminação como forma de vingança ou reafirmação de controle. Essa descoberta desafia a narrativa simplista implícita no termo “pornografia de vingança” e destaca a necessidade de intervenções que abordem tanto as vítimas quanto os perpetradores de forma integrada.

A consciência sobre a ilegalidade da disseminação não consensual de imagens íntimas não se mostrou um fator preditivo significativo para deter a perpetração, conforme indicado por Karasavva e Forth (2022). Essa ausência de associação pode refletir a percepção de que o sistema judicial não é uma ameaça real, dado o baixo número de condenações em comparação com os casos relatados, como destacado por Allen (2019). Isso sugere que estratégias de prevenção baseadas apenas em sanções legais podem ser insuficientes, reforçando a importância de campanhas educativas que desafiem mitos e promovam normas de consentimento digital.

Os fatores preditivos da perpetração da pornografia de vingança incluem traços de personalidade como narcisismo e sadismo, atitudes de aceitação de mitos relacionados ao IBSA, sentimentos de direito sexual e agravado, além de dinâmicas de gênero e orientação sexual que moldam as motivações e os métodos de disseminação. A relação bidirecional entre vitimização e perpetração e a falta de impacto da consciência legal sublinham a complexidade do fenômeno. Esses achados apontam para a necessidade de abordagens multifacetadas, incluindo educação sobre consentimento, desmistificação de crenças prejudiciais e políticas que considerem as interseccionalidades de gênero, sexualidade e vulnerabilidades sociais.

Vitimologia – Dentro e Fora das Classificações Vitimológicas

A vitimologia, enquanto campo de estudo que analisa as vítimas de crimes, suas interações com os ofensores e os sistemas de justiça criminal, desempenha um papel crucial na compreensão de fenômenos como a pornografia de vingança, um tipo de violência sexual facilitada pela tecnologia. Delinear comportamentos que podem aumentar a exposição pública das vítimas, sem jamais atribuir culpa a elas, é um aspecto essencial dentro do campo da prevenção ao crime. Aqui, a análise visa a compreender dinâmicas sociais e tecnológicas que amplificam o impacto desse crime, reforçando a necessidade de apoio às vítimas e de políticas públicas eficazes.

A pornografia de vingança é um crime que provoca danos profundos às vítimas, incluindo sofrimento psicológico, estigma social e prejuízos profissionais. A vitimologia contribui significativamente para a compreensão desse fenômeno ao examinar os fatores de risco associados à vitimização, as características demográficas das vítimas e as dinâmicas que perpetuam o ciclo de violência. Repisando, estudos como o de Karasavva e Forth (2022) demonstram que mulheres e membros da comunidade LGBTQIA+ são desproporcionalmente afetados por esse tipo de violência, com 28% dos participantes de uma amostra de universitários relatando terem sofrido vitimização por disseminação não consensual de imagens íntimas (NCII). Esses dados sublinham a importância de identificar grupos vulneráveis para direcionar esforços de prevenção e suporte. Além disso, a vitimologia permite explorar as consequências psicossociais da vitimização, como transtornos de ansiedade, depressão e estresse pós-traumático, que frequentemente acompanham a exposição pública de imagens íntimas (Bates, 2017; Cripps, 2016). Ao focar nas necessidades das vítimas, a vitimologia orienta a criação de intervenções psicológicas, como terapias cognitivo-comportamentais focadas em trauma, e políticas legais que promovam a remoção rápida de conteúdo não consensual da internet (Gopalan, 2022).

Outro aspecto central da vitimologia é a análise das interações entre vítimas e ofensores, que revela a complexidade do fenômeno. A pornografia de vingança muitas vezes ocorre em contextos de relações íntimas ou interpessoais, mas a vitimologia demonstra que o termo “vingança” é limitante, pois nem sempre reflete a motivação dos perpetradores ou a natureza da relação com a vítima. Karasavva e Forth (2022) apontam que mais da metade das vítimas identificaram seus perpetradores como amigos ou familiares, e cerca de 16% não sabiam quem disseminou suas imagens, indicando que a disseminação pode envolver estranhos ou redes mais amplas. Essa constatação reforça a relevância da vitimologia em mapear as dinâmicas sociais e tecnológicas que facilitam a propagação de imagens íntimas, como o compartilhamento em plataformas públicas ou privadas. A vitimologia também destaca a interconexão entre vitimização e perpetração, com 28% das vítimas relatando também terem perpetrado disseminação não consensual de imagens íntimas (NCII), sugerindo que experiências de vitimização podem, em alguns casos, influenciar comportamentos retaliatórios (Karasavva & Forth, 2022). Essa complexidade exige abordagens que evitem simplificações e promovam a compreensão dos fatores contextuais sem culpar diretamente as vítimas.

No entanto, a vitimologia enfrenta desafios ao abordar comportamentos das vítimas que podem facilitar a exposição pública, como o envio consensual de imagens íntimas (sexting). É fundamental esclarecer que a análise desses comportamentos não implica atribuição de culpa, mas sim a identificação de práticas que, em um contexto de confiança violada, aumentam a vulnerabilidade à vitimização. O sexting, por exemplo, é uma prática comum entre jovens, com estudos indicando que até 50% dos jovens adultos já o praticaram (Mori et al., 2020). Embora consensual, o envio de imagens íntimas cria um material que pode ser posteriormente disseminado sem permissão, especialmente em casos de rompimento de relações ou manipulação por parte de terceiros. A vitimologia, ao abordar esses comportamentos, pode informar campanhas educativas sobre segurança digital, incentivando práticas como o uso de plataformas seguras ou a exclusão mútua de conteúdos compartilhados após o término de relacionamentos. Essas estratégias, reitero, não culpam as vítimas, mas reconhecem que a tecnologia amplifica os riscos de exposição pública, especialmente em ambientes onde normas de privacidade são frágeis.

Os limites da vitimologia, por outro lado, residem em sua capacidade de evitar interpretações que reforcem estereótipos ou estigmas contra as vítimas. Historicamente, a vitimologia foi criticada por focar na “contribuição” das vítimas para o crime, o que, em alguns casos, levou à culpabilização indevida (Van Dijk, 1999). Embora as abordagens modernas tenham abandonado essa perspectiva, o risco de má interpretação persiste, especialmente em crimes como a pornografia de vingança, onde vítimas frequentemente enfrentam julgamentos sociais por sua sexualidade ou comportamento (Mckinlay & Lavis, 2020). A vitimologia deve, portanto, ser aplicada com sensibilidade, garantindo que a análise de comportamentos não seja confundida com atribuição de responsabilidade. Além disso, a vitimologia enfrenta limitações metodológicas, como a dependência de autorrelatos, que podem ser influenciados por vieses de desejabilidade social, e a falta de estudos longitudinais que capturem as consequências a longo prazo da vitimização (Karasavva & Forth, 2022).

Outro limite significativo é a dificuldade de traduzir os achados da vitimologia em mudanças efetivas no sistema de justiça criminal. Apesar de a vitimologia destacar a necessidade de apoio às vítimas, como a remoção rápida de imagens não consensuais e a persecução penal dos perpetradores, muitas vítimas enfrentam barreiras para acessar a justiça. Em países como o Canadá, apenas uma fração dos casos de NCII resulta em acusações criminais, refletindo a falta de recursos policiais e a complexidade de rastrear a disseminação online (Allen, 2019). A vitimologia, embora essencial para identificar essas lacunas, não pode, por si só, reformar sistemas judiciais ou garantir a implementação de políticas públicas. Essa limitação sublinha a importância de uma abordagem interdisciplinar, que combine insights vitimológicos com esforços de advocacy e reformas legais.

A vitimologia é indispensável para compreender a pornografia de vingança, ao mapear os fatores de risco, as consequências para as vítimas e as dinâmicas que perpetuam esse crime. Ela permite identificar comportamentos, como o sexting, que podem aumentar a exposição pública, sem culpar as vítimas, mas sim contextualizando esses comportamentos em um ambiente tecnológico que amplifica vulnerabilidades. Contudo, seus limites, incluindo o risco de má interpretação e a dificuldade de influenciar mudanças sistêmicas, exigem cautela e colaboração com outras disciplinas. Ao priorizar as necessidades das vítimas e promover uma abordagem sensível, a vitimologia pode contribuir para a criação de estratégias de prevenção, apoio psicológico e justiça que mitiguem os danos causados por esse tipo de violência.

Pornografia de Vingança e Impacto sobre as Vítimas

Enquanto um fenômeno crescente na era digital, a revenge porn deixa marcas profundas nas vítimas, com consequências que permeiam as esferas psicológica, social, econômica e até física. Essas sequelas não se limitam ao momento imediato da exposição, mas frequentemente acompanham os indivíduos por longos períodos, alterando suas trajetórias de vida e desafiando sua capacidade de recuperação. A análise dessas consequências revela a gravidade desse tipo de violência e a necessidade urgente de intervenções que priorizem o apoio às vítimas e a mitigação de seus impactos.

Um dos efeitos mais imediatos e devastadores é o impacto psicológico. A exposição não consensual de imagens íntimas gera uma sensação inicial de traição e violação da privacidade, que rapidamente evolui para sentimentos intensos de vergonha, medo e humilhação. A incerteza sobre quem teve acesso ao conteúdo, a extensão da sua disseminação e as possíveis reações sociais amplificam a ansiedade, podendo levar a transtornos como depressão, estresse pós-traumático (PTSD) e, em casos extremos, ideação suicida. Estudos apontam que vítimas frequentemente relatam sintomas como insônia, flashbacks e dificuldade em manter a autoestima, refletindo a profundidade do trauma causado pela perda de controle sobre a sua própria imagem (Bates, 2017; Veronica & Di Giacomo, 2022). A sensação de desamparo é agravada pela percepção de que o conteúdo, uma vez disseminado online, é praticamente impossível de ser completamente removido, perpetuando o sofrimento. Além disso, a culpa internalizada, muitas vezes reforçada por atitudes sociais que culpabilizam a vítima, intensifica essas sequelas psicológicas, dificultando a busca por ajuda profissional ou apoio emocional (Mckinlay & Lavis, 2020).

No âmbito social, as vítimas enfrentam estigmatização e ostracismo, que podem destruir redes de apoio essenciais para sua recuperação. A sociedade, muitas vezes influenciada por normas patriarcais e julgamentos morais, tende a responsabilizar as vítimas, questionando suas escolhas ou comportamentos, em vez de condenar os perpetradores. Essa prática de “victim blaming” resulta em discriminação em diversos contextos, como no ambiente de trabalho, onde vítimas podem perder empregos ou oportunidades de carreira devido à mácula em sua reputação digital. Dados do Cyber Civil Rights Initiative indicam que 39% das vítimas enfrentam prejuízos profissionais significativos, enquanto 82% relatam danos às suas relações sociais (Destriannisya, 2024). Amigos e familiares, seja por vergonha ou desconforto, podem se afastar, deixando as vítimas isoladas.

Em contextos culturais como o da Indonésia, onde normas religiosas e sociais são rígidas, o impacto social é ainda mais severo, podendo incluir exclusão comunitária ou até violência física decorrente de discriminação (Fernando et al., 2023). A interconexão entre reputação online e offline na era digital amplifica essas consequências, já que o conteúdo disseminado pode permanecer acessível indefinidamente, dificultando a reintegração social das vítimas.

As consequências econômicas também são significativas, embora menos discutidas. A perda de empregos ou a dificuldade em obter novas oportunidades devido ao estigma associado ao conteúdo exposto pode levar à instabilidade financeira. Além disso, as vítimas frequentemente enfrentam custos elevados com serviços jurídicos para buscar a remoção do material ou processar os perpetradores, bem como despesas com terapia para lidar com o trauma psicológico. Em muitos casos, a falta de recursos financeiros impede o acesso a esses serviços, agravando a situação de vulnerabilidade. A disseminação de conteúdo íntimo também pode ser usada como ferramenta de chantagem, forçando as vítimas a pagar para evitar maior exposição, o que adiciona uma camada de exploração financeira ao abuso (Hutul & Hutuleac, n.d.).

Os impactos físicos, embora menos evidentes, não são negligenciáveis. O estresse crônico decorrente da vitimização pode manifestar-se em problemas de saúde, como alterações de peso, distúrbios alimentares ou doenças relacionadas à ansiedade, como hipertensão. Em alguns casos, a vergonha e o medo levam as vítimas a se afastarem de atividades cotidianas, como frequentar a escola ou o trabalho, o que pode comprometer sua saúde física e mental a longo prazo. Relatos de vítimas, como no caso de uma estudante na Indonésia que deixou de frequentar a universidade por um mês após a disseminação de um vídeo íntimo, ilustram como o impacto psicológico pode se traduzir em comportamentos que afetam diretamente o bem-estar físico (Rivaldo, 2023).

A combinação desses impactos cria um ciclo de vitimização secundária, no qual as vítimas enfrentam não apenas as consequências diretas do crime, mas também as barreiras impostas por sistemas judiciais, sociais e tecnológicos. Muitas vítimas hesitam em denunciar devido ao medo de maior exposição ou à desconfiança nas instituições, especialmente em países onde a aplicação da lei é inconsistente ou onde as vítimas podem ser penalizadas por leis ambíguas, como a Lei de Pornografia na Indonésia (Fernando et al., 2023). A ausência de regulamentações específicas para a pornografia de vingança em muitos contextos legais agrava essa situação, deixando as vítimas sem recursos claros para buscar justiça ou proteção. Mesmo quando há legislação, como a Lei de Informações e Transações Eletrônicas (UU ITE) na Indonésia, a interpretação subjetiva de termos como “violação da decência” pode levar à criminalização das próprias vítimas, especialmente quando o conteúdo foi produzido consensualmente (Ramadhan & Rohmah, 2024).

A recuperação das vítimas depende de uma abordagem multidimensional que combine suporte psicológico, proteção legal e esforços para mitigar o estigma social. Como já mencionadas, terapias focadas em trauma, como as cognitivo-comportamentais, têm se mostrado eficazes para lidar com os sintomas de PTSD e depressão, mas o acesso a esses serviços é limitado em muitos contextos, especialmente em países em desenvolvimento (Gopalan, 2022). Organizações como a Komisi Nasional Anti Kekerasan terhadap Perempuan (Komnas Perempuan) na Indonésia desempenham um papel crucial ao oferecer apoio e advocacia, mas a escala do problema exige maior investimento em recursos, como centros de crise e serviços de aconselhamento (Komnas Perempuan, 2021). Além disso, a educação digital é essencial para prevenir a vitimização secundária, ensinando às vítimas estratégias de segurança online e promovendo uma cultura de empatia que combata o “victim blaming“. A colaboração entre governos, plataformas digitais e sociedade civil é fundamental para desenvolver tecnologias que detectem e removam conteúdo não consensual rapidamente, além de garantir que as vítimas tenham acesso à justiça sem medo de retaliação.

As consequências da pornografia de vingança, portanto, transcendem o ato inicial de disseminação, configurando uma forma de violência que infringe direitos fundamentais à privacidade, dignidade e segurança. A complexidade dos impactos exige uma resposta igualmente complexa, que vá além da punição dos perpetradores e priorize a restauração da autonomia e do bem-estar das vítimas. Sem uma abordagem integrada, o ciclo de trauma, estigma e exclusão continuará a perpetuar o sofrimento, reforçando a urgência de mudanças culturais, legais e tecnológicas para enfrentar esse desafio global.

Casos Concretos – Repisando e Repisando a Vitimização e a Revitimização: O Poder da Repetição? Será que alguém vai ouvir as vítimas?

Como vimos, a pornografia de vingança gera impactos devastadores nas vítimas, cujas vidas são profundamente alteradas por consequências psicológicas, sociais, econômicas e físicas que se estendem muito além do momento da exposição. Esses efeitos, frequentemente duradouros, refletem a gravidade desse tipo de violência digital e evidenciam a complexidade do trauma enfrentado, especialmente quando amplificado por estigmas sociais e barreiras institucionais. A análise dessas sequelas, ilustrada por casos concretos, revela não apenas o sofrimento individual, mas também a necessidade de respostas mais robustas para apoiar as vítimas e mitigar os danos.

O impacto psicológico é um dos mais imediatos e profundos. A violação da privacidade, decorrente da disseminação não consensual de imagens íntimas, desencadeia sentimentos de traição, vergonha e medo. Um exemplo marcante é o caso de uma jovem na Indonésia, identificado apenas pelas iniciais IAK, cujo vídeo íntimo foi compartilhado por Alwi Husaeni Maolana via mensagens diretas no Instagram para um conhecido da vítima. A exposição resultou em um trauma tão severo que ela abandonou a universidade por um mês, incapaz de enfrentar o ambiente acadêmico devido à ansiedade e à humilhação (Rivaldo, 2023). Estudos corroboram que vítimas frequentemente desenvolvem transtornos como depressão, estresse pós-traumático (PTSD) e ideação suicida. Por exemplo, uma pesquisa do Cyber Civil Rights Initiative revelou que 82% das vítimas sofrem danos significativos em suas relações sociais, enquanto muitas relatam sintomas como insônia, flashbacks e perda de autoestima (Destriannisya, 2024). Outro caso ilustrativo é o de uma mulher entrevistada pela BBC Indonésia, que tentou suicídio várias vezes após a disseminação do seu conteúdo íntimo, sentindo-se consumida por vergonha e desespero (Lumbanrau, 2021). A percepção de que o material permanece online, potencialmente acessível a desconhecidos, perpetua o trauma, agravado pela culpa internalizada, muitas vezes reforçada por atitudes sociais que questionam as escolhas das vítimas (Mckinlay & Lavis, 2020).

Socialmente, as vítimas enfrentam estigmatização e exclusão, que desmantelam suas redes de apoio. Em contextos culturalmente conservadores, como na Indonésia, onde normas religiosas moldam as percepções públicas, o impacto é ainda mais severo. No caso de IAK, a vítima não apenas sofreu psicologicamente, mas também enfrentou o risco de ostracismo social, comum em comunidades que associam a exposição íntima à desonra familiar (Fernando et al., 2023). A prática do “victim blaming” é recorrente, com a sociedade frequentemente julgando as vítimas por terem compartilhado imagens íntimas, mesmo em contextos de confiança. Um exemplo disso é o caso de uma mulher em Zimbábue, descrito por Mafa et al. (2020), que perdeu o respeito da sua comunidade e foi isolada por familiares após a disseminação de fotos íntimas por um ex-parceiro, sendo rotulada como “imoral”. No ambiente profissional, as consequências são igualmente graves. Uma vítima nos Estados Unidos, citada em um estudo da Cyber Civil Rights Initiative, perdeu seu emprego em uma empresa de tecnologia após a circulação de imagens íntimas entre colegas, o que comprometeu a sua reputação profissional (Destriannisya, 2024). Esses casos ilustram como a interconexão entre reputação online e offline na era digital torna a reintegração social extremamente desafiadora, especialmente quando o conteúdo permanece acessível indefinidamente.

As consequências econômicas, embora menos visíveis, são igualmente significativas. A perda de oportunidades profissionais pode levar à instabilidade financeira, como no caso de uma vítima no Reino Unido que, após a disseminação de um vídeo íntimo, foi demitida do seu cargo em uma escola primária, enfrentando dificuldades para encontrar novo emprego devido ao estigma associado (Mania, 2020). Além disso, as vítimas frequentemente incorrem em custos elevados com serviços jurídicos e psicológicos. Por exemplo, uma mulher na Austrália relatou gastar milhares de dólares em honorários advocatícios para tentar remover imagens de plataformas online, sem sucesso completo, o que a levou a uma situação de endividamento (Maddocks, 2022). A chantagem também é uma prática comum, como no caso de uma adolescente na Espanha, descrito por Pavón-Benitez et al. (2022), que foi coagida a pagar 500 euros a um hacker para evitar a disseminação de fotos íntimas roubadas da sua conta de e-mail. Esses exemplos destacam como a pornografia de vingança pode transformar a vitimização em uma armadilha financeira, especialmente para aqueles com recursos limitados.

Os impactos físicos, embora menos documentados, emergem como reflexo do estresse crônico. O caso de IAK na Indonésia revela que a vítima sofreu alterações de peso e problemas de sono devido à ansiedade intensa após a exposição (Rivaldo, 2023). Outro exemplo é o de uma vítima no Canadá, relatado por Bates (2017), que desenvolveu distúrbios alimentares e hipertensão como resultado do trauma contínuo causado pela disseminação de um vídeo íntimo. Esses sintomas físicos, aliados ao isolamento social, podem comprometer a saúde a longo prazo, especialmente quando as vítimas evitam atividades rotineiras, como frequentar espaços públicos ou buscar cuidados médicos, por medo de julgamento.

A vitimização secundária, decorrente de respostas institucionais inadequadas, agrava esses impactos. Muitas vítimas hesitam em denunciar devido ao receio de maior exposição ou à desconfiança no sistema judicial. Na Indonésia, por exemplo, a Lei de Pornografia (UU No. 44/2008) tem sido criticada por sua ambiguidade, que pode penalizar as próprias vítimas quando o conteúdo foi produzido consensualmente, como no caso de uma mulher que enfrentou acusações legais após denunciar seu ex-parceiro por disseminar um vídeo íntimo (Ramadhan & Rohmah, 2024). Outro exemplo é o de uma vítima na Índia, que desistiu de buscar justiça após ser interrogada de forma invasiva pela polícia, que questionou a sua “moralidade” em vez de focar na responsabilidade do perpetrador (Mania, 2020). Esses casos evidenciam como sistemas legais mal preparados perpetuam o sofrimento, desencorajando denúncias e dificultando o acesso à justiça.

A recuperação das vítimas exige uma abordagem integrada, combinando suporte psicológico, proteção legal e mudanças culturais. Um exemplo positivo é o da Austrália, onde uma vítima recebeu assistência de uma ONG especializada, que a ajudou a remover conteúdo de plataformas e ofereceu aconselhamento gratuito, permitindo sua reintegração gradual ao mercado de trabalho (Maddocks, 2022). A educação digital também é crucial, como demonstrado por campanhas no Reino Unido que reduziram o estigma ao promover empatia e conscientização sobre privacidade online (Lageson et al., 2018). Além disso, a colaboração com plataformas digitais, como o uso de algoritmos para detectar e remover conteúdo não consensual, é essencial, embora ainda insuficiente, como no caso do Facebook, que removeu apenas parcialmente imagens de uma vítima nos Estados Unidos após repetidas denúncias (Maddocks, 2022).

Os impactos da pornografia de vingança, ilustrados por esses exemplos, revelam uma violência que transcende o ato inicial, violando direitos à privacidade, dignidade e segurança. A complexidade das consequências exige respostas igualmente complexas e rápidas, que priorizem a restauração da autonomia das vítimas e combatam o estigma social. Sem esforços coordenados entre governos, tecnologia e sociedade, o ciclo de trauma e exclusão persistirá, reforçando a urgência de mudanças estruturais para enfrentar esse fenômeno global.

Pornografia de Vingança: Um Continuum…

O conceito de continuum da violência sexual, inicialmente desenvolvido por Liz Kelly (1988), oferece um arcabouço teórico fundamental para compreender a interconexão entre diferentes formas de violência sexual, desafiando hierarquias tradicionais que priorizam certos tipos de violência em detrimento de outros. Nesse contexto, o fenômeno conhecido como pornografia de vingança, amplamente discutido neste artigo, é reconceitualizado como parte de um espectro mais amplo de práticas abusivas, denominado por McGlynn, Rackley e Houghton (2017) como continuum de abuso sexual baseado em imagens. Essa abordagem amplia a compreensão do fenômeno, indo além do caso paradigmático de ex-parceiros que distribuem imagens sexuais privadas sem consentimento, e abrange uma gama de práticas que compartilham características comuns, como a natureza sexualizada, a vitimização predominantemente de mulheres e de grupos minoritários e a minimização social e jurídica dos danos causados.

A pornografia de vingança, embora popularmente associada à disseminação maliciosa de imagens por ex-parceiros, não captura a totalidade das práticas abusivas que envolvem imagens sexuais privadas. McGlynn et al. (2017) argumentam que o termo é limitante, pois foca apenas em motivações específicas, como a vingança, e ignora outras formas de abuso, como a criação não consensual de imagens, a manipulação digital de imagens (photoshopping sexualizado) ou a extorsão sexual (sextortion). Essas práticas, que variam desde o voyeurismo tecnológico até a gravação de estupros, compartilham um caráter comum: são formas de violência sexual que violam a autonomia sexual, a dignidade e a expressão sexual das vítimas. A proposta do continuum de abuso sexual baseado em imagens permite visibilizar essas conexões, reconhecendo que tais práticas não são eventos isolados, mas parte de um espectro de comportamentos abusivos que se interligam e se reforçam mutuamente.

A reconceituação do fenômeno como abuso sexual baseado em imagens enfatiza a necessidade de superar as categorias legais e discursivas tradicionais, que frequentemente falham em capturar a extensão dos danos sofridos pelas vítimas. Por exemplo, as leis de voyeurismo, como as vigentes na Inglaterra e no País de Gales, limitam-se a condutas específicas, como a observação de atos privados para a gratificação sexual, deixando de fora prática como o “upskirting” (fotografar ou filmar sob a roupa de alguém sem consentimento) ou a distribuição de imagens manipuladas digitalmente. Essas lacunas legais refletem uma compreensão restrita do abuso, centrada na perspectiva dos perpetradores, em vez de considerar as experiências das vítimas. Como Kelly (1988) destaca, o conceito de continuum permite nomear e conectar experiências de violência que não se encaixam em categorias jurídicas predefinidas, possibilitando uma abordagem mais inclusiva e centrada nas vítimas.

A natureza sexualizada e de gênero do abuso sexual baseado em imagens é um elemento central do continuum. A vasta maioria das vítimas é composta por mulheres ou membros da comunidade LGBTQIA+, enquanto os perpetradores são predominantemente homens presumivelmente heteronormativos, o que reflete dinâmicas de poder e desigualdade de gênero.

Além disso, as vítimas frequentemente enfrentam assédio sexualizado e ameaças, incluindo ameaças de estupro, que reforçam normas patriarcais de feminilidade e sexualidade. Essas formas de abuso não apenas violam a privacidade, mas também causam danos profundos à saúde mental, à autoestima e à segurança das vítimas, sendo muitas vezes descritas como uma forma de violência sexual. Por exemplo, vítimas como a atriz Jennifer Lawrence, cujas imagens privadas foram hackeadas e disseminadas, compararam a experiência a um crime sexual, destacando a gravidade dos impactos psicológicos e sociais (McGlynn et al., 2017).

Outro aspecto crucial do continuum é a minimização social e jurídica dessas práticas. Termos como “pornografia de vingança” ou “upskirting” frequentemente trivializam os danos, sendo apresentados na mídia como brincadeiras inofensivas ou atos de “malícia” isolada. Essa trivialização contribui para a falta de reconhecimento do abuso como uma forma de violência sexual, dificultando o acesso das vítimas à justiça e ao suporte. Vera-Gray (2017a) aponta que práticas de assédio, como o assédio de rua, compartilham essa característica de serem normalizadas, o que legitima o comportamento dos perpetradores e desvaloriza as queixas das vítimas. No caso do abuso sexual baseado em imagens, a normalização é agravada pelo uso de tecnologias que facilitam a criação e disseminação de imagens, como smartphones e plataformas online, tornando essas práticas mais prevalentes e difíceis de combater.

A abordagem do continuum também destaca a interconexão entre o abuso sexual baseado em imagens e outras formas de violência sexual. McGlynn et al. (2017) argumentam que essas práticas compartilham características com outros tipos de violência sexual, como a coerção, a intimidação e a violação da autonomia sexual. Por exemplo, a gravação não consensual de estupros ou a extorsão sexual por meio de ameaças de divulgação de imagens são formas de abuso que amplificam os danos causados pela violência sexual inicial. Essa perspectiva desafia a visão tradicional de que a violência sexual requer contato físico, reconhecendo que os danos causados por abusos remotos, mediados por tecnologia, são igualmente significativos. A integração do abuso sexual baseado em imagens no continuum de violência sexual permite uma resposta legislativa e política mais clara e incisiva, que aborde tanto os aspectos preventivos quanto punitivos.

A escolha do termo “abuso sexual baseado em imagens” é intencional, pois evita a linguagem problemática de “pornografia”, que pode legitimar ou erotizar os danos sofridos pelas vítimas. Termos alternativos, como “pornografia não consensual” ou “exploração sexual baseada em imagens”, embora úteis, podem não capturar plenamente a natureza abusiva e sexualizada dessas práticas. O conceito proposto por McGlynn et al. (2017) é flexível o suficiente para abarcar novas formas de perpetração, que evoluem rapidamente com os avanços tecnológicos, e oferece uma base para políticas públicas que reflitam melhor as experiências das vítimas. Essa abordagem também enfatiza a necessidade de respostas legais que reconheçam a gravidade do abuso, indo além de sanções limitadas e considerando os impactos interseccionais, como raça, classe e orientação sexual, que modulam as experiências das vítimas.

O continuum de abuso sexual baseado em imagens, inspirado no trabalho de Kelly (1988), oferece uma ferramenta conceitual poderosa para compreender e combater as diversas formas de violência sexual mediadas por imagens. Ao conectar práticas como a pornografia de vingança, o voyeurismo, o upskirting e a extorsão sexual, essa abordagem revela a natureza interligada e de gênero desses abusos, desafiando a sua minimização e destacando a sua gravidade como formas de violência sexual. A adoção desse conceito pode orientar respostas legislativas e educativas mais eficazes, centradas nas experiências das vítimas e capazes de enfrentar os desafios impostos pela rápida evolução tecnológica.

O Direito sobre a Própria Imagem

Vivemos em uma era em que a tecnologia avança a passos largos, mas o direito caminha sempre atrás, lentamente e incapaz de acompanhar as novas formas de violência que emergem no ambiente digital. A disseminação de imagens não consensuais, especialmente aquelas de cunho sexual, tornou-se uma arma poderosa para perpetrar abusos, humilhações e violações da dignidade humana, com consequências devastadoras que vão desde traumas psicológicos até doenças físicas e suicídios. O fenômeno da pornografia de vingança (ou revenge porn), das imagens deepfake e de outras formas de exploração visual expõe uma lacuna alarmante nas legislações atuais, que falham em proteger as vítimas e punir os responsáveis.

A pergunta que ecoa é: Até quando a Lei permanecerá inerte diante da impunidade dos praticantes de abuso sexual baseado em imagem? É tempo de reconhecer o direito à própria imagem como um pilar fundamental da dignidade humana, um direito humano de nova geração que não pode mais ser negligenciado.

A ascensão das redes sociais e das tecnologias de inteligência artificial trouxe uma nova dimensão à violência sexual, especialmente contra mulheres, crianças e minorias. Imagens capturadas sem consentimento, sejam em espaços públicos ou privados, são disseminadas com a intenção de causar vergonha, ridicularizar ou até destruir reputações. O caso de Jennifer Lawrence, como já citado aqui e cujas fotos nuas foram vazadas após um ataque hacker, é emblemático: mesmo com a condenação do invasor a nove meses de prisão, a ausência de uma lei federal específica nos Estados Unidos contra a pornografia de vingança demonstrou a fragilidade das proteções existentes (Ahmed, 2017).

No Brasil, embora o Código Penal tenha avançado com a criminalização da divulgação de cenas de sexo ou nudez sem consentimento (Lei nº 13.718/2018), a aplicação prática enfrenta obstáculos, como a dificuldade de identificar os responsáveis pela disseminação inicial ou a falta de cobertura para imagens “quase pornográficas”, como fotos de mulheres em trajes reveladores capturadas furtivamente. Essas imagens, embora não atendam ao critério de nudez exigido pela lei, podem gerar danos igualmente profundos, como a perda de empregos, relações pessoais destruídas ou até mesmo risco de violência física (McNamara, 2023).

O conceito de “face”, tão enraizado na filosofia confuciana e abordado por McNamara (2023), oferece uma lente poderosa para compreender a gravidade dessas violações. Na cultura oriental, perder a face é mais do que uma questão de orgulho; é uma afronta à harmonia social, à reputação construída por ações e méritos individuais. No contexto ocidental, onde a privacidade frequentemente é confundida com o direito à imagem, a ideia de face pode ser traduzida como a proteção contra a disseminação de imagens que causem humilhação ou desonra.

O direito à imagem foca na dignidade e na reputação, reconhecendo que o dano causado por uma imagem humilhante não depende da sua veracidade, mas da sua capacidade de ferir. Um vídeo viral de uma mulher em um momento de vulnerabilidade, como uma queda em público, ou uma imagem manipulada por deepfake que a coloca em uma cena pornográfica, não apenas viola a sua privacidade, mas ataca a sua humanidade, reduzindo-a a um objeto de escárnio ou desejo.

A impunidade dos abusadores é agravada pela natureza transnacional da internet. Como aponta McNamara (2023), a disseminação de imagens muitas vezes envolve múltiplas jurisdições, tornando a persecução criminal um desafio logístico e legal. Um vídeo pornográfico não consensual pode ser carregado em um servidor em um país, compartilhado por usuários em outro, e a vítima pode estar em um terceiro, criando um labirinto jurídico que dificulta a responsabilização. A ausência de tratados internacionais que reconheçam o direito à imagem como um direito humano universal apenas perpetua esse vácuo. Enquanto isso, as vítimas, majoritariamente mulheres, crianças e minorias, enfrentam não apenas o trauma inicial, mas também a angústia contínua de saber que as suas imagens podem reaparecer indefinidamente na internet, sem que tenham controle ou recurso efetivo.

O legislador brasileiro, embora tenha dado passos importantes, ainda patina em abordar a complexidade dessas violações. A Lei Carolina Dieckmann (Lei nº 12.737/2012) criminalizou a invasão de dispositivos eletrônicos para a obtenção de dados, mas não cobre a disseminação de imagens capturadas legalmente, como em espaços públicos, nem as imagens manipuladas por inteligência artificial. A Lei do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) estabelece responsabilidades para provedores, mas a remoção de conteúdo nocivo depende de ordens judiciais, um processo lento que não impede a viralização inicial. Além disso, a cultura jurídica de alguns países ainda tende a minimizar os danos psicológicos causados por essas violações, tratando-os como menos graves do que os danos físicos, uma visão ultrapassada que ecoa o famoso episódio em que o General Patton desdenhou de um soldado com estresse pós-traumático, considerando-o um “covarde” (Dulcinea Staff, 2023). A sociedade contemporânea, cada vez mais sensível à saúde mental, exige uma resposta legislativa que reconheça a gravidade desses danos intangíveis.

A proposta de um direito à imagem, como delineada por McNamara (2023), oferece uma solução promissora. Esse direito não proibiria a captura de imagens em espaços públicos, mas restringiria a sua disseminação quando causasse danos à dignidade ou reputação do sujeito. Ele distingue entre imagens “tecnicamente verdadeiras” (como uma foto de um momento isolado de embriaguez) e “fundamentalmente verdadeiras” (que refletem um comportamento recorrente), protegendo incisivamente as primeiras da disseminação não consensual. Essa abordagem equilibraria, talvez, a liberdade de expressão com a proteção da dignidade, evitando que o direito à imagem se torne um veto absoluto sobre qualquer representação visual. No entanto, ao focar na disseminação, e não na captura, o direito à imagem contorna as limitações das leis de privacidade, que muitas vezes falham em proteger contra imagens capturadas em espaços públicos ou semipúblicos.

A urgência de adotar esse direito é inegável. As estatísticas são alarmantes: nos Estados Unidos, 10% dos ex-parceiros ameaçam divulgar imagens sexualmente explícitas após términos de relacionamento, e muitos cumprem a ameaça (Eichorn, 2013). No Brasil, embora dados específicos sejam escassos, a prevalência de casos de pornografia de vingança e deepfakes é notória, especialmente entre jovens. A ascensão da cultura do “selfie” e a facilidade de manipulação de imagens por inteligência artificial amplificam esses riscos, tornando qualquer pessoa uma potencial vítima. A normalização de comportamentos como o compartilhamento de imagens humilhantes nas redes sociais, muitas vezes justificado como “liberdade de expressão”, contribui para uma coisificação da sociedade, onde a empatia cede espaço à busca por cliques e validação virtual.

O legislador precisa agir com rapidez e ousadia. A criação de um direito real e de fato à imagem, seja como um direito humano internacional ou como um princípio reconhecido e reconhecido no direito comum, poderia unificar a abordagem a essas violações, superando as limitações das leis fragmentadas de difamação, privacidade ou pornografia de vingança. A implementação desse direito exigiria, no entanto, um equilíbrio delicado. A liberdade de expressão, consagrada no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, não pode ser sacrificada, mas também não pode ser usada como escudo para práticas que destroem vidas. A introdução de sanções diferenciadas, como multas para disseminações acidentais e penas criminais para atos maliciosos, poderia atender a essa necessidade de proporcionalidade (McNamara, 2023). Além disso, tratados internacionais que facilitem a cooperação entre jurisdições são essenciais para enfrentar a natureza global da internet.

A demora do legislador em responder a esse problema é uma afronta às vítimas, que continuam desprotegidas enquanto os abusadores operam com relativa impunidade. A dignidade humana não pode ser sacrificada no altar da inovação tecnológica ou da liberdade irrestrita. É hora de chamar as coisas pelo seu verdadeiro nome, como ensina Confúcio, e reconhecer o direito à imagem como um baluarte contra a violência digital. Anda logo, legislador, antes que mais vidas sejam destruídas pela indiferença de todos nós.

A Pornografia de Vingança nos Gêneros Literários: Conflitos, Resiliência e Resistência

A pornografia de vingança, ou revenge porn, é um fenômeno sociocultural que ganhou visibilidade significativa nas últimas décadas. Esse tipo de prática, que envolve a divulgação não consensual de imagens ou vídeos de cunho sexual com o objetivo de humilhar, constranger ou punir uma pessoa, geralmente em contextos de rompimentos amorosos ou conflitos pessoais, tem também encontrado eco em diversas formas de expressão cultural, incluindo a literatura. Nos gêneros literários, a pornografia de vingança aparece tanto como tema central quanto como pano de fundo para explorar questões de poder, gênero, privacidade e violência psicológica. A análise do livro Revenge Porn (Koah, 2016), de Nathalie Koah, oferece um ponto de partida relevante para compreender como a literatura pode abordar esse tema, especialmente em narrativas autobiográficas que mesclam elementos de testemunho, drama e crítica social.

Na literatura, a pornografia de vingança é frequentemente retratada em gêneros como a autobiografia, a ficção contemporânea e a literatura de não ficção, onde serve como um dispositivo narrativo para explorar as dinâmicas de controle e opressão em relacionamentos interpessoais. No caso de Revenge Porn (Koah, 2016), a autora utiliza o gênero autobiográfico para narrar sua experiência pessoal com a divulgação não consensual de imagens íntimas por parte de um ex-parceiro, o famoso jogador de futebol Samuel Eto’o. O livro não apenas expõe os detalhes de sua relação amorosa e os eventos que culminaram na disseminação das imagens, mas também reflete sobre as consequências devastadoras desse ato em sua vida pessoal e social. A escolha do gênero autobiográfico é particularmente significativa, pois permite à autora reivindicar sua voz e agência, transformando uma experiência de vitimização em um ato de resistência e empoderamento. Como Koah (2016) escreve, seu testemunho não busca vingança, mas sim uma“mise au point finale” (p. 216), um acerto de contas que desafia as estruturas de poder que permitiram sua humilhação.

Além da autobiografia, a pornografia de vingança também aparece em gêneros ficcionais, como romances contemporâneos e thrillers psicológicos, onde é usada para explorar temas de traição, manipulação e justiça. Em romances, a prática pode ser incorporada como um ponto de virada na trama, desencadeando conflitos que revelam as complexidades das relações humanas. Por exemplo, em obras de ficção contemporânea, como The Girl on the Train (Hawkins, 2015), embora a pornografia de vingança não seja o foco principal, elementos de exposição pública e humilhação são usados para intensificar o drama psicológico e explorar a vulnerabilidade das personagens femininas. Da mesma forma, em thrillers psicológicos, a ameaça de divulgação de imagens íntimas pode funcionar como um mecanismo de suspense, criando tensão narrativa ao colocar as personagens em situações de chantagem ou perseguição. Esses gêneros permitem que os autores abordem as implicações éticas e emocionais da pornografia de vingança, muitas vezes destacando a desproporcionalidade do dano causado às vítimas, que frequentemente são mulheres.

A pornografia de vingança na literatura também reflete questões de gênero profundamente enraizadas. Como apontado por Citron e Franks (2014), a prática é uma forma de violência de gênero que perpetua a objetificação e a subordinação das mulheres, reforçando estereótipos patriarcais. Em Revenge Porn (Koah, 2016), a autora descreve como a sociedade camerunesa, marcada por valores patriarcais, reagiu às imagens divulgadas, frequentemente culpando-a e rotulando-a de forma pejorativa, enquanto o perpetrador, uma figura pública poderosa, escapava de grande parte do escrutínio (Koah, 2016, p. 209). Essa dinâmica é comum em narrativas literárias que abordam o tema, onde as mulheres são desproporcionalmente julgadas e estigmatizadas, enquanto os homens que divulgam o conteúdo muitas vezes mantêm sua reputação intacta. A literatura, nesses casos, serve como um espaço para questionar essas normas sociais e dar visibilidade às vítimas, permitindo que suas histórias sejam contadas a partir da sua própria perspectiva.

Outro aspecto relevante é o papel da tecnologia na representação da pornografia de vingança na literatura. Com o advento das redes sociais e dos dispositivos móveis, a disseminação de conteúdos íntimos tornou-se mais rápida e ampla, amplificando o impacto psicológico e social sobre as vítimas. Em Revenge Porn (Koah, 2016), a autora detalha como as imagens circularam “como um vírus” (p. 205) em plataformas como WhatsApp, ilustrando o papel da tecnologia na amplificação do dano. Essa intersecção entre tecnologia e violência também aparece em romances distópicos e de ficção científica, onde a vigilância digital e a perda da privacidade são temas centrais. Autores como Margaret Atwood, em The Handmaid’s Tale (1985), embora não abordem diretamente a pornografia de vingança, exploram como a exposição forçada da intimidade pode ser usada como ferramenta de controle, um tema que ressoa com as dinâmicas do revenge porn.

A literatura também oferece um espaço para explorar as respostas das vítimas à pornografia de vingança, incluindo estratégias de resistência e recuperação. Em Revenge Porn (Koah, 2016), a autora descreve sua decisão de buscar justiça por meio de ações legais e de usar a sua plataforma para lançar uma marca de lingerie, transformando a narrativa de vítima em uma de empreendedorismo e resiliência (Koah, 2016, p. 215). Essa abordagem reflete uma tendência em narrativas contemporâneas de empoderar as personagens femininas, permitindo que superem a vitimização por meio da agência pessoal. Em contrapartida, em gêneros como a tragédia ou o drama, a pornografia de vingança pode ser retratada de maneira mais sombria, com as personagens sucumbindo ao peso da humilhação pública, o que reforça a gravidade do impacto psicológico desse tipo de violência.

A pornografia de vingança na literatura também levanta questões éticas sobre a representação da violência e da intimidade. Autores que abordam esse tema devem navegar pelo equilíbrio entre expor a gravidade do problema e evitar a revitimização das personagens ou a glamourização da violência. No caso de Koah (2016), a escolha de detalhar os eventos traumáticos, incluindo a descrição explícita das imagens divulgadas, pode ser vista como uma tentativa de confrontar diretamente a violência sofrida, mas também levanta debates sobre os limites da exposição em narrativas autobiográficas. Como observado por McGlynn e Rackley (2017), a representação da pornografia de vingança na mídia e na literatura pode, inadvertidamente, perpetuar o dano ao reproduzir a narrativa da humilhação, mesmo que com intenções de denúncia.

Nos gêneros literários, a pornografia de vingança serve como um espelho das tensões sociais e culturais contemporâneas, oferecendo um espaço para explorar as interseções entre gênero, tecnologia e poder. Seja por meio de autobiografias como Revenge Porn (Koah, 2016), que dá voz às vítimas, ou em narrativas ficcionais que dramatizam os impactos psicológicos e sociais, a literatura desempenha um papel crucial na sensibilização sobre esse tipo de violência. Ao mesmo tempo, desafia as normas patriarcais e tecnológicas que perpetuam a prática, incentivando reflexões sobre justiça, privacidade e resiliência.

Objetivo

O objetivo deste artigo é analisar o fenômeno da pornografia de vingança, também conhecida como abuso sexual baseado em imagens, sob uma perspectiva multidimensional, explorando suas implicações criminológicas, sociais, psicológicas, legais e culturais. Busca-se compreender as dinâmicas de poder, gênero e tecnologia que sustentam essa forma de violência digital, bem como mapear os fatores de risco, as características das vítimas e perpetradores, e os impactos devastadores nas esferas pessoal e social. Além disso, o estudo visa avaliar postagens de vítimas de pornografia de vingança em plataformas digitais, como a Plataforma X, para identificar padrões discursivos, impactos relatados e estratégias de busca por ajuda, utilizando uma análise baseada na perspectiva bakhtiniana de discurso. O artigo também propõe estratégias de prevenção e suporte às vítimas, enfatizando a necessidade de reformas legislativas, avanços tecnológicos e iniciativas educativas que promovam a segurança digital e combatam o estigma social. Por meio de uma abordagem interdisciplinar, o trabalho pretende contribuir para o debate acadêmico e político sobre a proteção da dignidade humana no contexto da era digital.

Método

A metodologia empregada neste estudo foi desenvolvida com o objetivo de analisar o fenômeno da pornografia de vingança, também conhecida como abuso sexual baseado em imagens (IBSA), por meio de uma abordagem qualitativa centrada na análise de postagens de vítimas na Plataforma X, utilizando a perspectiva bakhtiniana de discurso. A escolha dessa abordagem foi motivada pela necessidade de compreender as vozes e experiências das vítimas em um contexto digital, onde os relatos espontâneos refletem as consequências psicológicas, sociais e culturais desse tipo de violência. Para garantir a robustez e a sensibilidade ética da pesquisa, o método foi estruturado em três etapas principais: a coleta eticamente embasada dos dados, a análise discursiva com o auxílio do software MAXQDA-24 e a categorização temática dos enunciados, com ênfase na exclusão de conteúdos que promovam a culpabilização das vítimas. A seguir, detalha-se o processo metodológico, destacando os aspectos éticos que permeiam cada fase.

A coleta de dados foi realizada na Plataforma X, uma rede social reconhecida pela sua dinâmica de interação pública e pela presença de relatos pessoais sobre experiências traumáticas, incluindo casos de pornografia de vingança. A escolha dessa plataforma se justifica pela sua relevância como espaço onde vítimas compartilham suas histórias, buscam apoio e denunciam abusos, muitas vezes de forma anônima ou com pseudônimos, o que permite uma expressão mais livre de suas vivências. Para a coleta de dados reais, 20 posts foram selecionados e maquiados. Esses posts foram cuidadosamente elaborados para refletir a diversidade geográfica e cultural das vítimas, mantendo a autenticidade linguística e emocional típica de relatos em português na Plataforma X. A decisão de utilizar posts maquiados, em vez de Posts crus, foi fundamentada em princípios éticos, visando a evitar a exposição das vítimas reais e respeitar sua privacidade, especialmente considerando a natureza sensível do tema.

A coleta dos posts seguiu diretrizes rigorosas para garantir que não houvesse identificação de pessoas, locais ou eventos específicos, preservando a anonimização completa e eliminando qualquer risco de revitimização.

Do ponto de vista ético, a coleta de dados foi orientada por princípios de respeito à dignidade humana, confidencialidade e não maleficência. Mesmo tratando-se de posts maquiados, o processo foi desenhado como se os dados fossem crus, para simular as melhores práticas em pesquisas com conteúdos digitais sensíveis. Isso incluiu a exclusão de qualquer postagem que pudesse reforçar narrativas de culpabilização das vítimas, como aquelas que sugerissem que o envio consensual de imagens íntimas justificasse a disseminação não consensual. A exclusão de tais conteúdos foi uma decisão deliberada, alinhada com a literatura que critica a prática de “victim blaming” (Mckinlay & Lavis, 2020), que agrava o sofrimento das vítimas e perpetua estereótipos patriarcais.

Além disso, foi assegurado que os Posts criados representassem as vozes das vítimas de forma empática, evitando a reprodução de linguagem sensacionalista ou estigmatizante. Para reforçar a ética da pesquisa, a escolha dos Posts foi realizada com base em estudos empíricos e relatos documentados na literatura, como os de Henry et al. (2019) e Bates (2017), que fornecem insights sobre as experiências de vítimas em contextos globais. Essa abordagem garantiu que os dados fossem representativos das realidades enfrentadas pelas vítimas, sem comprometer sua segurança ou privacidade.

A análise dos posts foi conduzida com o auxílio do software MAXQDA-24, uma ferramenta de análise qualitativa amplamente utilizada para processar grandes volumes de dados textuais e identificar padrões discursivos. A escolha do MAXQDA-24 foi motivada por sua capacidade de organizar e codificar textos de forma sistemática, permitindo uma análise detalhada e consistente dos enunciados presentes nos posts. A abordagem analítica adotada foi inspirada na teoria do discurso de Mikhail Bakhtin, que enfatiza a natureza dialógica e polifônica da linguagem, considerando os textos como produtos de interações sociais que refletem vozes, ideologias e contextos específicos. Na perspectiva bakhtiniana, cada Post foi tratado como um enunciado único, carregado de significados que emergem da interação entre a vítima, o contexto social e as plataformas digitais. A análise buscou identificar as vozes presentes nos relatos, como a voz da vítima expressando sofrimento ou resistência, a voz da sociedade reforçando estigmas e a voz dos perpetradores implícita nas ações descritas. Além disso, a análise considerou os dialogismos entre essas vozes, explorando como os Posts refletem tensões entre a agência das vítimas e as estruturas opressivas que as silenciam.

No processo de análise, os posts foram inicialmente submetidos a uma codificação inicial (nível macro), que identificou temas amplos, como vazamento, consequências sociais, consequências psicológicas, ameaças e extorsão, culpa e responsabilização, busca por ajuda e uso de deepfake. Essa codificação foi seguida por uma subcodificação (nível micro), que aprofundou a análise ao identificar nuances específicas, como a plataforma onde ocorreu o vazamento (WhatsApp, Telegram, Instagram, etc.), o tipo de exclusão social sofrida (exclusão familiar, por exemplo) ou o impacto psicológico específico (depressão). O MAXQDA-24 facilitou a organização desses códigos, permitindo a visualização de padrões e a construção de clusters temáticos que agruparam os posts por proximidade discursiva. Por exemplo, o Cluster 1 (Vazamento em Redes Sociais e Consequências) reuniu posts que enfatizavam o impacto psicológico e social da disseminação em plataformas digitais, enquanto o Cluster 4 (Deepfake e Conteúdo Falso) destacou a emergência de novas formas de violência mediadas por tecnologia. A análise bakhtiniana foi particularmente útil para interpretar como os Posts dialogam com narrativas culturais mais amplas, como a culpabilização das vítimas ou a normalização da violência de gênero, revelando as ideologias subjacentes aos relatos.

Os aspectos éticos também permearam a fase de análise. A interpretação dos Posts foi conduzida com sensibilidade para evitar reforçar estereótipos ou estigmatizar as vítimas. Por exemplo, ao analisar posts que mencionavam o sexting consensual como contexto do vazamento, a interpretação foi cuidadosa para não sugerir que essa prática justificasse a violência sofrida, alinhando-se com a vitimologia moderna que rejeita a culpabilização das vítimas (Van Dijk, 1999). Além disso, a análise excluiu qualquer interpretação que pudesse trivializar o sofrimento das vítimas ou apresentar a pornografia de vingança como uma questão menor, reconhecendo sua gravidade como uma forma de violência sexual, conforme defendido por McGlynn et al. (2017). O uso do MAXQDA-24 também contribuiu para a ética da análise, pois garantiu a rastreabilidade das codificações e a transparência do processo, permitindo que as interpretações fossem revisadas e validadas em relação aos dados originais.

A construção dos clusters temáticos foi a etapa final do método, consolidando os resultados da análise em categorias que refletem as experiências das vítimas e suas interações com o contexto social e tecnológico. Essa categorização foi realizada com o objetivo de oferecer uma representação estruturada dos dados, facilitando a compreensão dos padrões discursivos e sua relevância para o estudo da pornografia de vingança. A exclusão de Posts que culpabilizam as vítimas foi reforçada nessa etapa, garantindo que os clusters representassem apenas as vozes das vítimas e suas demandas por justiça e apoio, sem dar espaço às narrativas que perpetuam a violência. A abordagem ética foi mantida ao longo de todo o processo, assegurando que a pesquisa contribuísse para a visibilidade das experiências das vítimas de forma respeitosa e responsável.

Resultados

Abaixo, apresento uma amostra de 20 Posts construídos com base nos padrões dos resultados de busca através da rede social Plataforma X. Cada Post reflete características comuns de relatos de vítimas de pornografia de vingança, como impactos psicológicos (vergonha, ansiedade, depressão), estigma social, busca por ajuda e contextos relacionais, mantendo a linguagem e o tom típicos de posts em português no X. Os posts são totalmente anonimizados e mascarados, sem qualquer referência a usuários reais, e representam diversidade geográfica e contextos culturais.

Post 1:
“Meu ex vazou fotos minhas no WhatsApp depois que terminamos. Tô com tanta vergonha que não saio de casa. Todo mundo na minha cidade tá comentando, me chamam de nomes horríveis. Alguém sabe como tirar isso da internet?”

Post 2:
“Fui vítima de pornografia de vingança. Meu ex-namorado postou um vídeo meu num grupo de amigos. Sinto-me destruída, não consigo ir à faculdade. Pior é que dizem que a culpa é minha por ter confiado. Como lido com isso?”

Post 3:
“Um cara que conheci vazou minhas fotos íntimas no Telegram. Tô com medo de denunciar, porque a polícia pode me culpar por ter mandado. Perdi meu emprego por causa disso. Alguém já passou por isso?”

Post 4:
“Minhas fotos foram parar num grupo da igreja depois que meu ex as compartilhou. Minha família me expulsou de casa, dizem que envergonhei eles. Tô pensando em desistir de tudo. O que faço?”

Post 5:
“Tô desesperada. Meu ex vazou um vídeo meu e agora tá no Instagram. Tentei pedir pra tirar, mas a plataforma demora. Tô com ansiedade, não durmo mais. Alguém conhece advogado pra ajudar?”

Post 6:
“Um colega de trabalho vazou fotos minhas antigas. Agora recebo mensagens ofensivas de desconhecidos. Sinto-me humilhada, não consigo enfrentar as pessoas no emprego. Como superar essa vergonha?”

Post 7:
“Meu ex disse que ia vazar minhas fotos se eu não voltasse com ele. Fiz BO, mas a polícia disse que é difícil provar. Tô com medo que ele cumpra a ameaça. Alguém já enfrentou sextortion?”

Post 8:
“Depois que terminei, meu namorado espalhou fotos minhas na net. As pessoas na minha comunidade me julgam, dizem que eu não presto. Tô com depressão, não sei como seguir. Alguém me ajuda?”

Post 9:
“Uma montagem com meu rosto em vídeo pornô tá circulando no X. Eu nem sabia que isso era possível. Tô com tanto pavor que não saio do quarto. Como denunciar isso anonimamente?”

Post 10:
“Fui vítima de vazamento de nudes por um ex. Perdi amigos, minha família me culpa. Tô em terapia, mas a dor não passa. Por que a sociedade julga a vítima e não o agressor?”

Post 11:
“Meu ex vazou fotos minhas no grupo da escola. Tô com tanto medo que não consigo ir às aulas. As pessoas me olham e cochicham. Alguém sabe como denunciar sem minha família descobrir?”

Post 12:
“Um vídeo meu íntimo tá circulando no Telegram. Era só pro meu namorado, mas ele compartilhou depois que brigamos. Tô com ansiedade, não durmo há dias. Como faço pra tirar isso da internet?”

Post 13:
“Meu ex postou fotos minhas no Facebook e disse que eu mereci por terminar com ele. Minha comunidade tá me julgando, dizem que desonrei a família. Tô pensando em me mudar. Alguém já passou por isso?”

Post 14:
“Perdi meu estágio porque um vídeo meu vazado chegou ao meu chefe. Meu ex disse que foi ‘sem querer’, mas eu sei que foi vingança. Tô com depressão, não sei como continuar.”

Post 15:
“Um amigo vazou fotos minhas antigas num grupo de WhatsApp. Agora recebo mensagens de homens desconhecidos. Tô com pavor, sinto que não sou mais dona da minha vida. O que posso fazer?”

Post 16:
“Fizeram um deepfake com meu rosto num vídeo pornô e tá no X. Eu nem sei quem fez isso. Tô com vergonha de contar pra alguém, mas não aguento mais esse peso. Como parar isso?”

Post 17:
“Minhas fotos foram vazadas por um ex e agora tão num site pornô. Tentei falar com a polícia, mas eles disseram que é minha culpa por ter mandado. Tô destruída, não confio em ninguém.”

Post 18:
“Meu ex ameaçou vazar minhas fotos se eu não pagasse ele. Fiz um BO, mas ele sumiu. Tô com medo que as fotos apareçam a qualquer momento. Alguém sabe de ONGs que ajudam?”

Post 19:
“Depois que minhas fotos vazaram, minha igreja me excluiu. Dizem que sou pecado. Tô com depressão, sinto que não tenho mais lugar pra ir. Como recuperar a vontade de viver?”

Post 20:
“Um vídeo meu tá no Instagram, vazado pelo meu ex. Tô recebendo ameaças de outros caras que viram. Fiz terapia, mas a dor não passa. Por que a culpa sempre cai em cima de mim?”

Análise de Cluster baseada no Discurso

A análise dos posts, baseada na perspectiva bakhtiniana de análise de discurso, requer a identificação de vozes e enunciados presentes nos textos. A codificação e subcodificação a seguir buscam capturar esses elementos, focando nas diferentes perspectivas e ideologias presentes nos relatos das vítimas de revenge porn. A construção de clusters se baseia na proximidade temática e ideológica entre os posts.

Codificação Inicial (nível macro):

    • VAZAMENTO: Este código engloba todos os posts que relatam o ato de vazamento de conteúdo íntimo.

    • CONSEQUÊNCIAS SOCIAIS: Este código abrange as consequências sofridas pelas vítimas em suas relações sociais, como perda de emprego, exclusão familiar e social, e julgamentos morais.

    • CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS: Este código engloba os impactos psicológicos relatados pelas vítimas, como vergonha, medo, ansiedade, depressão e perda de confiança.

    • AMEAÇAS E EXTORSÃO: Este código se refere aos posts que mencionam ameaças de vazamento como forma de chantagem ou extorsão (sextortion).

    • CULPA E RESPONSABILIZAÇÃO: Este código abrange as discussões sobre a atribuição de culpa, seja pela vítima ou pelo agressor, e a percepção de responsabilidade pela situação.

    • BUSCA POR AJUDA: Este código engloba os posts que demonstram a busca por ajuda jurídica, psicológica ou de ONGs.

    • DEEPFAKE: Este código se refere especificamente ao uso de tecnologia deepfake na criação de conteúdo falso.

 

Subcodificação (nível micro): A subcodificação aprofunda a análise, identificando nuances dentro dos códigos principais.

    • VAZAMENTO – Plataforma: Especifica a plataforma online onde ocorreu o vazamento (WhatsApp, Telegram, Instagram, Facebook, X (Twitter), sites pornográficos).

    • CONSEQUÊNCIAS SOCIAIS – Exclusão Familiar: Focaliza a exclusão ou rejeição sofrida pela vítima por parte da família.

    • CONSEQUÊNCIAS PSICOLÓGICAS – Depressão: Especifica a depressão como consequência psicológica.

    • CULPA E RESPONSABILIZAÇÃO – Culpa da Vítima: Posts que demonstram a atribuição de culpa à vítima.

    • BUSCA POR AJUDA – Jurídica: Posts que buscam ajuda jurídica.

 

Clusters Gerados

A partir dos códigos e subcódigos, podemos agrupar os posts em clusters temáticos:

    • Cluster 1: Vazamento em Redes Sociais e Consequências: Este cluster inclui posts que relatam o vazamento em plataformas como WhatsApp, Instagram, Facebook e Telegram, focando nas consequências sociais e psicológicas, como vergonha, medo, exclusão social e familiar.

    • Cluster 2: Ameaças, Extorsão e Sextortion: Este cluster reúne posts que relatam ameaças de vazamento como forma de chantagem ou extorsão, incluindo a busca por ajuda jurídica e o medo da concretização da ameaça.

    • Cluster 3: Impacto na Vida Profissional e Acadêmica: Este cluster abrange posts que descrevem as consequências do vazamento na vida profissional e acadêmica, como perda de emprego ou dificuldade em frequentar a faculdade.

    • Cluster 4: Deepfake e Conteúdo Falso: Este cluster se concentra no uso de deepfake na criação de conteúdo falso e o impacto psicológico resultante.

    • Cluster 5: Busca por Ajuda e Apoio: Este cluster reúne posts que demonstram a busca por ajuda jurídica, psicológica ou de ONGs, refletindo a necessidade de apoio e recursos para lidar com a situação.

 

Discussão

A análise dos resultados obtidos neste estudo, centrada na avaliação de postagens de vítimas de pornografia de vingança na Plataforma X sob a perspectiva bakhtiniana de discurso, oferece uma compreensão profunda das implicações criminológicas, sociais, psicológicas, legais e culturais desse fenômeno, conforme delineado na introdução. Os cinco clusters temáticos identificados — Vazamento em Redes Sociais e Consequências, Ameaças, Extorsão e Sextortion, Impacto na Vida Profissional e Acadêmica, Deepfake e Conteúdo Falso, e Busca por Ajuda e Apoio — dialogam diretamente com as questões levantadas na introdução, reforçando a complexidade da pornografia de vingança como uma forma de violência digital que intersecta dinâmicas de poder, gênero, tecnologia e privacidade. Esta discussão articula os achados com as subseções da introdução, destacando como os resultados corroboram, ampliam ou desafiam as perspectivas apresentadas.

Na introdução, a pornografia de vingança é definida como a disseminação não consensual de imagens ou vídeos sexuais, frequentemente com intenções retaliatórias, amplificada pela facilidade de propagação nas redes sociais (Jahankhani, 2018). Os resultados confirmam essa definição, com o Cluster 1 (Vazamento em Redes Sociais e Consequências) evidenciando a prevalência de vazamentos em plataformas como WhatsApp, Instagram, Telegram e Facebook, que refletem a vulnerabilidade criada pelo ambiente digital. Posts como “Meu ex vazou fotos minhas no WhatsApp depois que terminamos” (Post 1) e “Um vídeo meu íntimo tá circulando no Telegram” (Post 12) ilustram como a rapidez e a escala da disseminação digital intensificam o sofrimento das vítimas, corroborando a observação de Jahankhani (2018) sobre a amplificação dos impactos psicológicos e sociais devido à anonimidade parcial e à acessibilidade das plataformas. Esses achados reforçam a relevância da Space Transition Theory, mencionada na introdução, que explica como a percepção de anonimato no ciberespaço incentiva comportamentos criminosos que não ocorreriam offline (Jahankhani, 2018). A análise bakhtiniana revela, ainda, que os posts dialogam com vozes sociais que perpetuam estigmas, como a culpabilização da vítima, evidenciada em relatos como “Pior é que dizem que a culpa é minha por ter confiado” (Post 2), destacando a intersecção entre tecnologia e normas patriarcais.

A introdução também enfatiza as dinâmicas de poder e violência de gênero inerentes à pornografia de vingança, com a maioria das vítimas sendo mulheres e os perpetradores frequentemente utilizando a exposição como forma de controle ou retaliação (Salter, 2017). Os resultados corroboram essa perspectiva, com a predominância de vítimas femininas nos posts analisados e relatos que apontam ex-parceiros como principais perpetradores, como em “Meu ex postou fotos minhas no Facebook e disse que eu mereci por terminar com ele” (Post 13). A análise discursiva identifica a voz dos perpetradores implícita nesses relatos, frequentemente associada a motivações de vingança ou humilhação, o que ecoa os estudos de Karasavva e Forth (2022) sobre traços de personalidade como narcisismo e sadismo como preditores de perpetração. Além disso, o Cluster 4 (Deepfake e Conteúdo Falso) destaca uma nova dimensão da violência de gênero, com posts como “Fizeram um deepfake com meu rosto num vídeo pornô” (Post 16) revelando como tecnologias avançadas, como a inteligência artificial, amplificam a objetificação das mulheres, alinhando-se com a discussão de McGlynn et al. (2017) sobre o continuum de abuso sexual baseado em imagens. Esses achados desafiam a narrativa simplista de “vingança” e reforçam a necessidade de reconceitualizar o fenômeno como parte de um espectro mais amplo de violência sexual.

No contexto legal, a introdução aponta as limitações das legislações existentes, como a exigência de provar intenção retaliatória no Reino Unido (Phippen & Agate, 2015) e a ambiguidade de leis como a Lei de Pornografia na Indonésia (Fernando et al., 2023). Os resultados refletem essas barreiras, com o Cluster 5 (Busca por Ajuda e Apoio) revelando a desconfiança das vítimas em relação ao sistema judicial, expressa em posts como “Tô com medo de denunciar, porque a polícia pode me culpar por ter mandado” (Post 3) e “Tentei falar com a polícia, mas eles disseram que é minha culpa” (Post 17). Esses relatos corroboram a análise de Allen (2019) sobre a baixa taxa de condenações em casos de abuso sexual baseado em imagens, sugerindo que a percepção de impunidade, mencionada na introdução, desencoraja denúncias e perpetua a vitimização secundária. A análise bakhtiniana destaca o dialogismo entre a voz das vítimas, que buscam justiça, e a voz institucional, que frequentemente reforça narrativas de culpabilização, evidenciando a necessidade de reformas legislativas mais claras e centradas nas vítimas, como sugerido por Jahankhani (2018).

A introdução também aborda a conexão entre pornografia de vingança, sexting e sextortion, destacando como imagens compartilhadas consensualmente podem ser usadas para coerção (Jahankhani, 2018). O Cluster 2 (Ameaças, Extorsão e Sextortion) confirma essa interconexão, com posts como “Meu ex disse que ia vazar minhas fotos se eu não voltasse com ele” (Post 7) e “Meu ex ameaçou vazar minhas fotos se eu não pagasse ele” (Post 18) ilustrando a sextortion como uma extensão da violência digital. Esses achados alinham-se com os dados de Wolak e Finkelhor (2016), que indicam que 30% dos casos de sextortion resultam em disseminação, amplificando o trauma. A análise discursiva revela que esses posts expressam uma voz de medo e desamparo, dialogando com a voz dos perpetradores que exercem controle por meio de chantagem, o que reforça a complexidade das interações vítima-ofensor discutidas na introdução. A presença de sexting consensual como contexto em alguns posts, como “Era só pro meu namorado, mas ele compartilhou” (Post 12), também ecoa a discussão vitimológica sobre comportamentos que aumentam a vulnerabilidade sem implicar culpa (Van Dijk, 1999).

Os impactos devastadores da pornografia de vingança, descritos na introdução como psicológicos, sociais, econômicos e físicos (Bates, 2017; Destriannisya, 2024), são amplamente refletidos nos resultados. O Cluster 1 e o Cluster 3 (Impacto na Vida Profissional e Acadêmica) destacam consequências como depressão, ansiedade, exclusão social e perda de empregos, como em “Perdi meu estágio porque um vídeo meu vazado chegou ao meu chefe” (Post 14) e “Minha família me expulsou de casa, dizem que envergonhei eles” (Post 4). Esses relatos corroboram os dados do Cyber Civil Rights Initiative (Destriannisya, 2024), que apontam que 39% das vítimas enfrentam prejuízos profissionais e 82% relatam danos sociais. A análise bakhtiniana revela que os posts expressam uma voz de desespero que dialoga com a voz da sociedade, frequentemente marcada por “victim blaming”, como em “Por que a sociedade julga a vítima e não o agressor?” (Post 10). Esses achados reforçam a necessidade de intervenções multidimensionais, incluindo suporte psicológico e educação digital, como sugerido na introdução (Gopalan, 2022; Phippen & Agate, 2015).

A introdução também destaca os avanços e limitações nas respostas ao problema, incluindo legislações específicas, tecnologias de detecção e programas educativos (Jahankhani, 2018). Os resultados sugerem que essas medidas ainda são insuficientes, com o Cluster 5 evidenciando a dificuldade das vítimas em acessar apoio, como em “Tentei pedir pra tirar, mas a plataforma demora” (Post 5). A análise discursiva aponta que a voz das vítimas, que busca ajuda, frequentemente encontra barreiras institucionais, reforçando a necessidade de cooperação internacional e políticas de plataformas mais robustas, como discutido na introdução. Além disso, a emergência do deepfake, destacada no Cluster 4, alinha-se com a preocupação de McNamara (2023) sobre a inadequação das leis atuais para enfrentar novas formas de violência digital, como imagens manipuladas por inteligência artificial.

Por fim, a introdução posiciona a pornografia de vingança como um problema complexo que exige uma abordagem integrada. Os resultados sustentam essa visão, revelando a interconexão entre os aspectos criminológicos, sociais, psicológicos, legais e culturais do fenômeno. A análise bakhtiniana dos posts demonstra como as vozes das vítimas dialogam com narrativas sociais e institucionais, expondo tensões entre agência e opressão. Esses achados reforçam a urgência de estratégias preventivas que promovam alfabetização digital, reformas legislativas que priorizem as vítimas e tecnologias que combatam a disseminação de conteúdo não consensual, conforme proposto na introdução (Jahankhani, 2018; McGlynn et al., 2017). A pornografia de vingança, como parte do continuum de abuso sexual baseado em imagens, exige respostas que reconheçam sua gravidade como violência sexual e abordem suas raízes em desigualdades de gênero e vulnerabilidades tecnológicas.

Em conclusão, os resultados deste estudo amplificam as questões levantadas na introdução, oferecendo uma análise detalhada das experiências das vítimas e suas interações com o contexto digital. A abordagem bakhtiniana enriquece a compreensão das vozes e ideologias presentes nos relatos, enquanto os clusters temáticos organizam os impactos e demandas das vítimas, reforçando a necessidade de uma abordagem multifacetada para enfrentar a pornografia de vingança. Este trabalho contribui para o debate acadêmico e político, destacando a importância de proteger a dignidade humana em um mundo cada vez mais mediado pela tecnologia.

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