COMU XLIII 18/10/2024 – Súmula da Aula: “Transtornos Parafílicos – Foco em Pedofilia”

Congresso Médico Universitário – Faculdade de Medicina da USP – 18/10/2024

COMU

A apresentação “Transtornos Parafílicos – Foco em Pedofilia”, ministrada pelo Prof. Dr. Danilo Antonio Baltieri, oferece uma visão abrangente e complexa do transtorno pedofílico, situando-o dentro do espectro mais amplo dos transtornos parafìlicos. A aula aborda a problemática da sua definição, diagnóstico e tratamento, destacando as dificuldades inerentes a essa área e os desafios que a pesquisa enfrenta.

A apresentação inicia com uma revisão conceitual de parafilias e transtornos parafìlicos, utilizando a “herança” de Wakefield (1982) como ponto de partida para discutir as definições e os percalços encontrados na classificação desses transtornos. A distinção entre a abordagem da APA (2022) e a da OMS (2024) é explicitada, mostrando a complexidade em estabelecer critérios diagnósticos universalmente aceitos.

A seguir, é apresentada uma lista detalhada de parafilias, segundo a classificação da APA (2022), destacando o voyeurismo, exibicionismo, frotteurismo, masoquismo sexual, sadismo sexual (com a especificação do sadismo sexual coercivo), pedofilia, fetichismo, transtorno transvéstico e outras parafilias não especificadas. A OMS (2024), por sua vez, apresenta uma lista similar, mas com algumas nuances na classificação e na ênfase em comportamentos parafílicos que são concretizados de fato.

A prevalência dos transtornos parafìlicos é apontada como significativa (1% a 14%, segundo Federoff, 2022), com altas taxas de comorbidades (até 74%, Longpré et al., 2022) e um número considerável de indivíduos apresentando parafilias múltiplas (1/3 dos casos, Longpré et al., 2022). A heterogeneidade da população afetada é enfatizada, destacando a diferença entre amostras forenses e clínicas, incluindo o conceito implícito no Projeto “Dunkelfeld”.

A apresentação discute diferentes teorias que buscam explicar as parafilias, incluindo a Teoria da Corte (Freund, 1990), a Teoria do Mapa do Amor (Money, 1993), a teoria dos erros de localização de foco erótico (Lawrence, 2009), teorias psicodinâmicas (Yakeley, 2018), a teoria dos scripts sexuais desviados (Marshall & Miller, 2023) e as teorias neurobiológicas (Jordan et al., 2011; Kruger & Kneer, 2020).

Um foco significativo é dado ao transtorno pedofílico, considerado a parafilia mais estudada. A apresentação diferencia os interesses sexuais de um transtorno pedofílico, discutindo as implicações éticas e legais relacionadas. Modelos de correlação psicossocial (Phenix & Hoberman, 2016) e modelos baseados em esquemas sexuais (Mann & Beech, 2016) são apresentados, buscando integrar fatores neuropsicológicos, sociais e ambientais na compreensão do desenvolvimento do transtorno.

Modelos neurogenéticos são explorados, focando na baixa repetição do códon CAG no receptor de andrógeno (AR), no aumento do poder transacional do AR, na metilação do AR e na influência da exposição androgênica pré-natal. A modulação dopaminérgica é também discutida, bem como a associação com diversos polimorfismos genéticos (Alanko et al., 2016; Jordan et al., 2011; Li et al., 2017; Rajender et al., 2008; Tirabassi et al., 2015). A neuropsicologia da pedofilia é explorada, mencionando menor flexibilidade cognitiva, maior sinistralidade, problemas de memória, falhas no controle executivo, déficits de empatia, baixo desempenho acadêmico e impulsividade (Baltieri & Andrade, 2008; Cantor et al., 2005; Cohen et al., 2002; Kruger & Schiffer, 2011). A heterogeneidade é novamente ressaltada.

Os métodos diagnósticos atuais são brevemente abordados, incluindo autorrelato, testes de reação rápida, pletismografia peniana, aplicação do instrumento SSPI e avaliação de comorbidades. A neuroimagem e a genotipagem são mencionadas como áreas potenciais, mas ainda elusivas (Fisher & Marwaha, 2023; Tenbergen et al., 2015).

A avaliação de risco de reincidência é tratada com detalhes, mencionando instrumentos como SSPI (Seto and Lalumière, 2001), SVR-20 (Boer et al., 1997), Static-99 (Hanson and Thornton, 2000), Static-2002 (Hanson and Thornton, 2003), JSOAP (Prentky et al., 2000) e PCL-R (Hare, 2000). A “tríade negra” e os “crossover sexual offenders” são brevemente mencionados. Um gráfico ilustrativo mostra a quantidade de molestadores de crianças de acordo com a pontuação no SSPI. Dois pontos chave são mostrados em relação ao risco bombástico de reincidência: a combinação de pedofilia com transtorno de personalidade antissocial, e a combinação de pedofilia com deficiência intelectual, esta última com risco estimado em aproximadamente 24% (Craig, 2007; Marota, 2017).

Finalmente, a apresentação discute os aspectos do tratamento e a falta de incentivos robustos na área. Um gráfico demonstra a adesão ao tratamento em relação à atribuição de responsabilidade a fatores externos, mostrando uma correlação significativa. A apresentação conclui com uma reflexão sobre as implicações dessa falta de pesquisa, apontando para a tendência de minimizar o problema, aderir a discursos perniciosos e a omissão na criação de políticas públicas eficazes, finalizando com a frase provocativa: “tratar pedófilos não produz votos”.

Em suma, a apresentação do Prof. Baltieri apresenta um panorama complexo e multifacetado dos transtornos parafìlicos, com foco no transtorno pedofílico, destacando as dificuldades diagnósticas, os desafios no desenvolvimento de modelos explicativos e as lacunas significativas na pesquisa sobre o tratamento. A apresentação chama a atenção para a necessidade de uma abordagem multidisciplinar e para a importância de superar os obstáculos políticos e sociais que impedem o avanço do conhecimento e das intervenções nessa área crucial.

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