Câmara dos Deputados aprovou castração química para crimes sexuais contra menores

A Câmara dos Deputados aprovou recentemente um projeto que prevê a “castração química” como parte da punição para crimes sexuais envolvendo menores. A medida, no entanto, ainda precisa ser apreciada pelo Senado e tem gerado polêmica entre especialistas.
De acordo com o texto aprovado, condenados por crimes como estupro de vulnerável, prostituição infantil, aliciamento de menores ou posse e distribuição de material sexual envolvendo crianças e adolescentes poderão ser submetidos à chamada castração química. Apesar do nome, o procedimento não envolve castração física. Trata-se da administração de medicamentos orais ou injetáveis que inibem a libido e bloqueiam temporariamente a produção de testosterona.
Os medicamentos utilizados interferem na produção hormonal, reduzindo o desejo sexual e a ejaculação, mas sem efeitos permanentes. Embora amplamente usados no tratamento de condições como o câncer de próstata, esses medicamentos não foram desenvolvidos para lidar com transtornos sexuais, como a pedofilia. Além disso, os efeitos duram apenas enquanto os remédios são administrados, podendo se estender, de forma mais leve, por até seis meses após a suspensão do tratamento.
Profissionais da saúde e pesquisadores alertam que, mesmo com a redução da libido, o tratamento não impede comportamentos violentos. Gustavo Pires, farmacêutico e diretor secretário-geral do Conselho Federal de Farmácia (CFF), explica que o tratamento baseia-se no uso de inibidores de libido, como o acetato de medroxiprogesterona e o acetato de ciproterona. Esses medicamentos reduzem os níveis hormonais, mas, segundo ele, apresentam limitações importantes.
“Os efeitos dos medicamentos são temporários. Quando o tratamento é interrompido, a libido tende a retornar aos níveis anteriores. Além disso, a castração química não trata as causas psicológicas ou traumáticas subjacentes que podem levar ao comportamento sexual desviante. Relatos de efeitos colaterais significativos, como depressão, osteoporose, ganho de peso e redução geral da libido, também levantam preocupações sobre os impactos na saúde física e mental dos indivíduos tratados”, afirma Gustavo.
O psiquiatra Danilo Baltieri, especialista em transtornos sexuais, reforça que a pedofilia é um distúrbio psiquiátrico e deve ser tratada como tal. Segundo ele, não há evidências científicas de que a castração química reduza a reincidência de crimes sexuais.
O urologista Eduardo Miranda, da Sociedade Brasileira de Urologia, complementa que o problema precisa ser abordado sob a perspectiva psiquiátrica e não apenas hormonal. “A testosterona não é a causa da violência sexual. Sem uma abordagem médica adequada, a medida será ineficaz”, pontua.
Contexto internacional e riscos à saúde
Em países como França, Alemanha, Reino Unido e em alguns estados dos Estados Unidos, a terapia hormonal é aplicada de forma voluntária e com acompanhamento médico rigoroso. Na França, por exemplo, o procedimento só ocorre com o consentimento do preso, devido aos riscos associados, como disfunção hormonal permanente e problemas cardiovasculares.
No Brasil, especialistas alertam para as implicações éticas e jurídicas. Mauricio Stegemann Dieter, advogado e professor da Faculdade de Direito da USP, critica o projeto, afirmando que ele viola direitos fundamentais e a dignidade humana. Ele considera a proposta inconstitucional, pois obrigar alguém a ingerir substâncias que afetam a saúde representa uma afronta às garantias individuais.
Eficácia questionada
A falta de estudos conclusivos sobre a eficácia da castração química na redução da reincidência criminal é outra preocupação. Especialistas entrevistados avaliam que a proposta surge como uma resposta política, mais do que uma solução eficaz. Ariel de Castro, advogado especialista em direitos da criança e do adolescente, classifica a medida como uma solução “superficial e midiática” que não aborda as causas reais da violência sexual contra menores.
Embora a castração química tenha sido apresentada como uma medida para conter crimes sexuais, profissionais da saúde, juristas e estudiosos continuam a questionar sua eficácia e legalidade. A violência sexual é um problema complexo que demanda políticas públicas efetivas, com foco em educação, prevenção e tratamento adequado de transtornos psiquiátricos, além do endurecimento das penas para os criminosos.
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Médico psiquiatra. Professor Livre-Docente pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Foi Professor de Psiquiatria da Faculdade de Medicina do ABC durante 26 anos. Coordenador do Programa de Residência Médica em Psiquiatria da FMABC por 20 anos, Pesquisador do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria da FMUSP (GREA-IPQ-HCFMUSP) durante 18 anos e Coordenador do Ambulatório de Transtornos da Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC (ABSex) durante 22 anos. Tem correntemente experiência em Psiquiatria Geral, com ênfase nas áreas de Dependências Químicas e Transtornos da Sexualidade, atuando principalmente nos seguintes temas: Tratamento Farmacológico das Dependências Químicas, Alcoolismo, Clínica Forense e Transtornos da Sexualidade.