“Senhor, eu fui pego por policiais, porque eles me viram com um jovem (de 13 anos) atrás de um prédio público. O menino disse que eu estava mexendo nas partes baixas dele. Mas eu não estava fazendo qualquer coisa… apenas conversando. Já tive um processo por mexer com criança, mas a Justiça me considerou inocente, como, de fato eu sou. O senhor me pergunta quais são as minhas fantasias sexuais e eu repondo: tenho 45 anos, não tenho qualquer fantasia sexual com crianças…”
(Anônimo)
Excerto – Quando As Ferramentas para o Tratamento são negadas ao Psiquiatra Especialista em Agressores Sexuais
O discurso proposto aqui se concentra na negação do protagonista em relação às acusações de abuso sexual contra crianças. O discurso é marcado por estratégias de defesa, justificativas e tentativas de reconstruir a imagem do falante como inocente. A análise desse trecho baseia-se em conceitos como negação, justificação, construção de identidade e uso de estratégias retóricas.
O protagonista começa sua fala com uma negação direta: “Senhor, eu fui pego por policiais, porque eles me viram com um jovem (de 13 anos) atrás de um prédio público. O menino disse que eu estava mexendo nas partes baixas dele. Mas eu não estava fazendo qualquer coisa… apenas conversando.” O uso da palavra “mas” introduz uma contradição ao que foi dito anteriormente, reforçando a negação. Ele afirma que não estava fazendo “qualquer coisa”, minimizando a gravidade da situação ao sugerir que estava apenas “conversando”. Essa estratégia serve para desviar a atenção do ato em si (o possível abuso) e focar em uma atividade aparentemente inocente (conversar).
Ao dizer que estava “apenas conversando”, o protagonista tenta reduzir a gravidade da situação, sugerindo que a interação com o menino era benigna e sem intenções sexuais.
O protagonista tenta também construir uma imagem de si mesmo como inocente e vítima de um erro judicial: “Já tive um processo por mexer com criança, mas a Justiça me considerou inocente, como, de fato eu sou.” Ele menciona que a Justiça o considerou inocente em um processo anterior, o que serve para reforçar a sua inocência atual. Ao citar uma decisão judicial, ele apela a uma autoridade externa para validar sua afirmação de inocência.
A frase “como, de fato eu sou” é uma tentativa de reforçar sua própria credibilidade. Ele não apenas cita a Justiça, mas também afirma sua própria convicção de inocência, tentando convencer o ouvinte sobre a sua honestidade.
O protagonista utiliza estratégias retóricas para desviar a atenção das acusações e focar em aspectos que o favorecem: “O senhor me pergunta quais são as minhas fantasias sexuais e eu repondo: tenho 45 anos, não tenho qualquer fantasia sexual com crianças…” Com isso, ele redireciona a conversa para sua idade (45 anos) e para a negação de fantasias sexuais com crianças. Ao fazer isso, ele tenta desassociar-se do estereótipo de predador sexual, sugerindo que, por ser mais velho, não teria interesse em crianças.
De fato, ao mencionar a sua idade, ele pode estar tentando apelar para um estereótipo de que pessoas mais velhas não teriam interesse sexual em crianças, o que pode ser uma tentativa de ganhar simpatia ou compreensão do interlocutor, apesar de totalmente equivocado.
O discurso do protagonista é estruturado de forma a alternar entre negações e justificativas, criando uma narrativa que busca desconstruir a acusação e reconstruir sua imagem como inocente. Ele começa negando as acusações, depois justifica suas ações (apenas conversando) e, em seguida, reforça a sua inocência com uma referência a um processo anterior. Finalmente, ele redireciona a conversa para sua idade e nega ter fantasias sexuais com crianças.
O protagonista contrasta a acusação (“mexendo nas partes baixas”) com sua versão dos fatos (“apenas conversando”), criando uma oposição entre a gravidade da acusação e a inocência de suas ações.
Em suma, o discurso do protagonista é marcado por uma série de estratégias de negação, justificação e construção de identidade. Ele tenta minimizar a gravidade das acusações, apelar para autoridades externas (a Justiça) e redirecionar o foco da conversa para aspectos que o favorecem, como a sua idade e a ausência de fantasias sexuais com crianças. Essas estratégias servem para desconstruir a imagem de predador sexual e reconstruir uma imagem de inocência e vítima de um erro policial.
Essa análise demonstra como o discurso pode ser utilizado para manipular percepções e construir narrativas que inocentam o falante, mesmo em situações de tratamento médico, quando a verdade deve ser dita de maneira clara. A negação, a justificação e o uso de estratégias retóricas são ferramentas poderosas na construção de identidades e na defesa de posições em contextos de conflito ou mesmo terapêuticos.
Introdução
O tratamento dos agressores sexuais tem sido um tema de grande interesse e debate na área da psiquiatria clínico-forense e da criminologia. A efetividade do tratamento para agressores sexuais é frequentemente avaliada com base em parâmetros como a redução da reincidência criminal e a melhoria de aspectos psicológicos e comportamentais dos indivíduos em tratamento. No entanto, a literatura sobre o tema apresenta resultados mistos, com alguns estudos indicando benefícios significativos e outros questionando a efetividade dessas intervenções.
Trata-se de um tópico complexo e crucial na promoção da segurança pública. Embora existam debates acalorados sobre a efetividade do tratamento dos agressores sexuais (Hanson et al., 2009; Harrison et al., 2020; Schmucker & Lösel, 2015), um crescente corpo de evidências aponta para a importância da intervenção terapêutica como ferramenta fundamental para reduzir o risco de novas agressões (Schmucker & Lösel, 2017).
Estudos de curto prazo têm demonstrado que programas de tratamento cognitivo-comportamental para agressores sexuais podem ser eficazes na redução da reincidência. Marshall e Barbaree (1988) e Pithers e Cumming (1989) encontraram evidências de que intervenções focadas no controle de impulsos, prevenção de recaídas e aumento da empatia pelas vítimas podem contribuir para a redução de comportamentos criminosos. No entanto, estudos de longo prazo, como os de Hanson, Steffy e Gauthier (1993), sugerem que os efeitos positivos do tratamento podem diminuir com o tempo, levantando questões sobre a sustentabilidade dos resultados.
Uma revisão abrangente realizada por Furby, Weinrott e Blackshaw (1989) destacou que a falta de medidas padronizadas de avaliação de resultados e problemas metodológicos em muitos estudos dificultam a conclusão definitiva sobre a eficácia do tratamento. Além disso, Marshall et al. (1991) observaram que, embora alguns tratamentos tenham reduzido as taxas de reincidência para certos tipos de agressores sexuais, medidas gerais de saúde mental e de personalidade não demonstraram melhorias significativas, sugerindo que o tratamento pode não ser igualmente eficaz para todos os indivíduos. Afinal, trata-se de uma população por demais heterogênea em que “one size does not fit all”. Uma notável meta-análise realizada por Hanson, Bourgon, Helmus e Hodgson (2009) demonstra que intervenções baseadas em princípios específicos podem ser eficazes na redução da reincidência sexual e geral entre agressores sexuais. A meta-análise de Schmucker e Lösel (2017) destaca um efeito positivo médio do tratamento, embora ressalte a necessidade de considerar o contexto e as características específicas de cada programa.
Apesar da importância do tratamento, uma parcela significativa de agressores sexuais não o completa (Olver et al., 2011). A interrupção precoce do tratamento está fortemente associada a taxas mais elevadas de reincidência (Carl & Lösel, 2021).
Vários fatores contribuem para esse insucesso, incluindo:
Características do agressor: indivíduos com traços antissociais mais acentuados, pontuações mais altas em psicopatia e problemas relacionados ao uso de substâncias são mais propensos a abandonar o tratamento (Brunner et al., 2019; Carl et al., 2020; Olver & Wong, 2009, 2011).
Características do tratamento: programas com intensidade inadequada, falta de responsividade às necessidades individuais do agressor e falta de recursos adequados podem resultar em desistência (Bonta & Andrews, 2017; Olver et al., 2011).
Contexto prisional: as condições de encarceramento, a falta de motivação e o estigma associado à participação em programas de tratamento podem dificultar o comprometimento do agressor (McMurran & McCulloch, 2007; Endres et al., 2016).
Fatores relacionados à “dose” do tratamento: A duração e a intensidade da terapia são cruciais. Programas com poucas horas ou pouco comprometimento podem não ser eficazes e levar à desistência, resultando em maior probabilidade de reincidência (Sperber et al., 2012; Makarios et al., 2014).
A pesquisa de Carl e Lösel (2021) reforça a hipótese de que a interrupção precoce do tratamento, especialmente após um período significativo de envolvimento, tem um impacto negativo significativo na reincidência. O estudo sugere que a terminação precoce pode ser tão prejudicial quanto a falta de tratamento.
É crucial que os programas sejam adequados às necessidades individuais dos agressores, oferecendo tratamento intensivo e responsivo, e que se considerem as potenciais consequências negativas da interrupção precoce, incluindo a possibilidade de um efeito “negativo” na reintegração social. O tempo adequado para o tratamento seguramente é longo, mas não deve ser o agressor que se deve dar alta. São os médicos altamente especializado após longo seguimento, avaliação e reavaliação.
Fatores Relacionados a Melhores Resultados no Tratamento
Para que o tratamento seja eficaz, é essencial que ele se concentre nos fatores criminogênicos, ou seja, aqueles aspectos dinâmicos que estão diretamente relacionados ao risco de reincidência criminal e que são passíveis de tratamento e/ou abordagem psicossocial. De acordo com Harkins e Beech (2007), a abordagem de tratamento deve ser guiada pelos princípios de risco, necessidade e responsividade, propostos por Andrews e Bonta (2006). Esses princípios sugerem que a intensidade do tratamento deve ser proporcional ao nível de risco do agressor, que as intervenções devem focar nas necessidades criminogênicas específicas do indivíduo, e que o estilo de tratamento deve ser adaptado às características individuais do agressor.
Fatores Criminogênicos e Tratamento
1. Interesses Sexuais (Domínio 1)
O primeiro domínio criminogênico identificado por Thornton (2002) e Hanson e Harris (2000) refere-se aos interesses sexuais do agressor, incluindo a direção e a força da atração sexual. A presença de interesses sexuais desviantes, como a atração por crianças, é um dos preditores mais fortes de reincidência sexual (Hanson & Bussière, 1998; Hanson & Morton-Bourgon, 2004). O tratamento deve, portanto, incluir estratégias para modular esses interesses, como a reestruturação cognitiva e o redirecionamento masturbatório, que visam a reduzir a excitação sexual desviante e promover interesses sexuais normativos (Marques et al., 2005).
2. Atitudes Distorcidas (Domínio 2)
O segundo domínio envolve as atitudes distorcidas que justificam ou minimizam o comportamento sexual ofensivo. Agressores sexuais frequentemente apresentam crenças distorcidas sobre suas vítimas, sexualidade e o impacto dos seus crimes (Beech, Fisher, & Thornton, 2003). Essas atitudes podem ser avaliadas por meio de medidas psicométricas e entrevistas clínicas. O tratamento deve focar na identificação e desafio dessas crenças, promovendo uma compreensão mais realista e empática do impacto do comportamento ofensivo (Hanson & Harris, 2000).
3. Funcionamento Socioafetivo (Domínio 3)
O terceiro domínio refere-se ao funcionamento socioafetivo, incluindo déficits de intimidade e habilidades sociais. Agressores sexuais frequentemente apresentam dificuldades em estabelecer relacionamentos íntimos e saudáveis, o que pode contribuir para o comportamento ofensivo (Bumby & Hanson, 1997). O tratamento deve incluir intervenções que promovam a autoestima, a capacidade de estabelecer vínculos emocionais saudáveis e a regulação emocional (Marshall et al., 1997). A melhoria nesse domínio está associada a uma redução no risco de reincidência (Thornton, 2002).
4. Autogestão (Domínio 4)
O quarto domínio envolve a capacidade do agressor de gerenciar seus impulsos e planejar comportamentos de longo prazo. Problemas de autogestão, como impulsividade e falta de planejamento, são comuns entre agressores sexuais e estão associados a um maior risco de reincidência (Hanson & Morton-Bourgon, 2004). O tratamento deve incluir estratégias para melhorar a capacidade de autogestão, como o treinamento em habilidades de resolução de problemas e a prevenção de recaídas (Craig et al., 2005).
A efetividade do tratamento para agressores sexuais depende da capacidade de abordar esses domínios criminogênicos de forma integrada e individualizada. Além disso, é importante considerar fatores de responsividade, como a motivação do agressor para mudança e a presença de psicopatia, que podem influenciar a resposta ao tratamento (Andrews & Bonta, 2003). A literatura sugere que o tratamento é mais eficaz quando os agressores de alto risco recebem intervenções intensivas e específicas, enquanto aqueles de baixo risco podem se beneficiar de intervenções menos intensivas (Friendship, Mann, & Beech, 2003). A abordagem de tratamento para agressores sexuais deve ser baseada em uma avaliação cuidadosa dos fatores criminogênicos e das características individuais do agressor. A integração dos princípios de risco, necessidade e responsividade, juntamente com a atenção aos domínios criminogênicos, pode aumentar significativamente a efetividade do tratamento e reduzir o risco de reincidência.
Princípios de Risco, Necessidade e Responsidade no Tratamento de Agressores Sexuais
Os princípios de risco, necessidade e responsividade (RNR), propostos por Andrews e Bonta (2006), são considerados fundamentais para o sucesso do tratamento de agressores sexuais. Esses princípios sugerem que:
Princípio do Risco: Intervenções devem ser proporcionais ao risco de reincidência do indivíduo. Agressores de alto risco devem receber tratamentos mais intensivos, enquanto aqueles de baixo risco podem se beneficiar de intervenções menos intensivas (Hanson et al., 2009).
Princípio da Necessidade: O tratamento deve focar em necessidades criminogênicas, ou seja, fatores dinâmicos que estão diretamente relacionados ao comportamento criminoso. Para agressores sexuais, essas necessidades incluem interesses sexuais desviantes, nível de impulsividade sexual, atitudes tolerantes em relação ao crime sexual, déficits de intimidade (Hanson & Morton-Bourgon, 2004).
Princípio da Responsividade: O tratamento deve ser adaptado ao estilo de aprendizagem e às capacidades do indivíduo. Intervenções cognitivo-comportamentais têm sido apontadas como as mais eficazes, pois abordam diretamente os padrões de pensamento e comportamento que contribuem para a reincidência (Bonta & Andrews, 2007).
De fato, a adesão a esses princípios está associada a melhores resultados. Programas que seguem os princípios RNR parecem ser mais promissores na redução das taxas de reincidência sexual e geral (Hanson et al., 2009). Por exemplo, intervenções que focam em necessidades criminogênicas, como o controle de impulsos e a regulação de emoções, já se mostraram mais eficazes do que aquelas que abordaram fatores não criminogênicos (Hanson & Morton-Bourgon, 2005).
Parâmetros para uma Avaliação da Efetividade
A efetividade do tratamento é geralmente medida pela redução nas taxas de reincidência, tanto sexual quanto geral. Hanson et al. (2009) encontraram que, em média, agressores sexuais tratados apresentaram taxas de reincidência sexual de 10,9%, em comparação com 19,2% nos grupos de controle. Para a reincidência geral, as taxas foram de 31,8% para os tratados e 48,3% para os não tratados.
Outro parâmetro importante é a qualidade do estudo. Hanson et al. (2009) destacam que estudos com desenhos metodológicos mais robustos, como ensaios randomizados, tendem a fornecer evidências mais confiáveis sobre a eficácia do tratamento. No entanto, a maioria dos estudos disponíveis ainda apresenta limitações metodológicas, o que reforça a necessidade de mais pesquisas de alta qualidade.
Além disso, o local do tratamento (comunitário versus institucional) e a idade dos agressores (adultos versus adolescentes) também influenciam os resultados. Embora não haja consenso sobre qual setting é mais eficaz, intervenções comunitárias têm mostrado resultados promissores, especialmente para adolescentes (Lipsey, 1998). Para adultos, os resultados são mistos, com alguns estudos indicando que o tratamento comunitário pode ser mais eficaz do que o institucional (Andrews & Bonta, 2006).
Avaliação da Efetividade do Tratamento pelos Terapeutas
A avaliação da efetividade do tratamento para agressores sexuais geralmente envolve uma combinação de medidas objetivas e subjetivas. Um dos principais indicadores é a taxa de reincidência, que mede a ocorrência de novos crimes sexuais após o tratamento. No entanto, a reincidência é um critério limitado, pois não captura mudanças comportamentais ou psicológicas promovidas pelo tratamento.
Outro parâmetro importante é a utilização de escalas de avaliação clínica, como a Sex Offender Treatment Rating Scale (SOTRS), proposta por Anderson, Gibeau e D’Amora (1995). A SOTRS avalia dimensões como insight, pensamentos desviantes, consciência de riscos situacionais, motivação, empatia pela vítima e revelação das ofensas. Essa escala demonstrou alta consistência interna e confiabilidade entre os avaliadores, tornando-se uma ferramenta útil para o desenvolvimento de equipes, planejamento do tratamento e avaliação dos programas.
Além disso, a SOTRS pode ser usada para monitorar o progresso dos indivíduos ao longo do tempo, identificando quais aspectos do tratamento estão sendo mais eficazes e quais precisam de ajustes. Por exemplo, no estudo de Anderson et al. (1995), os terapeutas relataram dificuldades em avaliar pensamentos desviantes, sugerindo que essa área pode exigir maior atenção durante as intervenções.
A Sex Offender Treatment Rating Scale (SOTRS)
Como comentado anteriormente, esta escala é composta por seis itens principais, cada um com descritores comportamentais específicos que permitem aos terapeutas avaliar diferentes dimensões do progresso terapêutico. Cada um desses itens é avaliado em uma escala de 6 pontos, com descrições comportamentais que variam de baixo a alto desempenho. Abaixo, discutimos cada um desses itens com maior profundidade:
1. Insight (Compreensão)
O item Insight refere-se à capacidade do agressor sexual de compreender as suas motivações, crenças e atitudes que levaram ao comportamento ofensivo. Um alto nível de insight indica que o indivíduo é capaz de refletir sobre as suas ações, reconhecer padrões de pensamento distorcidos e entender como esses pensamentos contribuíram para o comportamento criminoso. Por outro lado, um baixo nível de insight sugere que o agressor pode não ter consciência dos fatores internos que influenciaram as suas ações, o que pode dificultar a mudança comportamental.
Exemplo de alto desempenho: O agressor reconhece que suas crenças distorcidas sobre relacionamentos e sexualidade contribuíram para o comportamento ofensivo e demonstra uma compreensão clara de como essas crenças se desenvolveram.
Exemplo de baixo desempenho: O agressor nega qualquer responsabilidade pelo comportamento ofensivo, atribuindo a culpa a fatores externos, como a vítima ou circunstâncias sociais.
2. Pensamentos Desviantes
Este item avalia a presença e a frequência de fantasias sexuais desviantes e impulsos relacionados ao comportamento ofensivo. A redução desses pensamentos é um objetivo central do tratamento, pois eles estão diretamente associados ao risco de reincidência. No entanto, como observado por Anderson et al. (1995), os terapeutas muitas vezes têm dificuldade em avaliar esse item, pois os agressores podem relutar em compartilhar informações sobre suas fantasias sexuais.
Exemplo de alto desempenho: O agressor relata uma redução significativa das fantasias sexuais desviantes e demonstra estratégias para lidar com esses pensamentos quando eles ocorrem.
Exemplo de baixo desempenho: O agressor continua a ter fantasias sexuais desviantes frequentes e não demonstra esforços para controlá-las ou substituí-las por pensamentos mais apropriados.
3. Consciência de Riscos Situacionais
Este item mede a capacidade do agressor de identificar situações de alto risco que podem desencadear comportamentos ofensivos. A consciência de riscos situacionais é um componente crítico da prevenção de recaídas, pois permite que o indivíduo evite ou gerencie situações que possam levar a comportamentos inadequados.
Exemplo de alto desempenho: O agressor é capaz de identificar claramente situações de alto risco (como estar sozinho com crianças ou consumir álcool em excesso) e desenvolve planos concretos para evitar, lidar com essas situações.
Exemplo de baixo desempenho: O agressor não reconhece situações de risco ou minimiza a sua importância, aumentando a probabilidade de recaída.
4. Motivação
A motivação aqui refere-se ao desejo do agressor de mudar e se engajar ativamente no tratamento. Muitos agressores sexuais são mandatados para tratamento por ordens judiciais, o que pode resultar em baixa motivação interna. A motivação é um fator crucial para o sucesso do tratamento, pois influencia a adesão às intervenções terapêuticas.
Exemplo de alto desempenho: O agressor demonstra um compromisso genuíno com a mudança, participa ativamente das sessões de terapia e busca ativamente estratégias para melhorar seu comportamento.
Exemplo de baixo desempenho: O agressor participa do tratamento apenas para cumprir exigências legais, sem demonstrar interesse real em mudar ou melhorar.
5. Empatia pela Vítima
A empatia pela vítima é a capacidade do agressor de compreender e se preocupar com o impacto emocional e psicológico que suas ações tiveram sobre a vítima. O desenvolvimento da empatia é um objetivo importante no tratamento, pois está associado a uma redução no risco de reincidência.
Exemplo de alto desempenho: O agressor demonstra uma compreensão profunda do sofrimento causado à vítima e expressa remorso genuíno por suas ações.
Exemplo de baixo desempenho: O agressor minimiza o impacto de suas ações sobre a vítima ou culpa a vítima pelo ocorrido, demonstrando pouca ou nenhuma empatia.
6. Revelação de Ofensas
Este item avalia a disposição do agressor em revelar informações completas e precisas sobre suas ofensas sexuais. A revelação completa é essencial para o tratamento, pois permite que os terapeutas identifiquem padrões de comportamento e desenvolvam intervenções específicas.
Exemplo de alto desempenho: O agressor revela detalhes completos sobre suas ofensas, incluindo motivações, circunstâncias e comportamentos específicos, sem tentar esconder ou minimizar suas ações.
Exemplo de baixo desempenho: O agressor omite informações importantes sobre suas ofensas ou distorce os fatos para minimizar sua responsabilidade.
Palavras Finais
Embora existam evidências de que o tratamento cognitivo-comportamental pode ser eficaz na redução da reincidência de agressores sexuais, a eficácia a longo prazo ainda é questionada. A utilização de medidas padronizadas de avaliação pelos próprios terapeutas, como a SOTRS, pode ajudar a melhorar a qualidade e a consistência dos programas de tratamento, fornecendo feedback valioso para o desenvolvimento de intervenções mais eficazes. No entanto, como observado por Anderson et al. (1995), alguns itens, como Pensamentos Desviantes, podem ser mais difíceis de avaliar devido à natureza sensível do tópico e à relutância dos agressores em compartilhar informações. Apesar dessas limitações, a SOTRS pode ser usada para monitorar o progresso ao longo do tempo, identificar áreas que necessitam de maior atenção e fornecer feedback para o aprimoramento dos programas de tratamento.
Parece que o tratamento de agressores sexuais pode ser eficaz quando baseado em princípios empiricamente validados, como os princípios RNR. O foco nas necessidades criminogênicas, a adaptação do tratamento ao perfil de risco de cada indivíduo e a utilização de abordagens cognitivo-comportamentais são fatores-chave para um melhor prognóstico.
Referências Anderson, R. D., Gibeau, D., & D’Amora, D. A. (1995). The Sex Offender Treatment Rating Scale: Initial Reliability Data. Sexual Abuse: A Journal of Research and Treatment, 7(3), 221-230. Andrews, D. A., & Bonta, J. (2006). The psychology of criminal conduct (4th ed.). Newark, NJ: LexisNexis/Anderson. Beech, A. R., Fisher, D. D., & Thornton, D. (2003). Risk assessment of sex offenders. Professional Psychology, Research and Practice, 34(4), 339-352. Bonta, J., & Andrews, D. A. (2007). Risk-need-responsivity model for offender assessment and rehabilitation. Corrections Research User Report No. 2007-06. Ottawa, Ontario: Public Safety Canada. Brunner, F., Neumann, I., Yoon, D., Rettenberger, M., Stück, E., & Briken, P. (2019). Determinants of dropout from correctional offender treatment. Frontiers in Psychiatry, 10, 142. Bumby, K. M., & Hanson, D. J. (1997). Intimacy deficits, fear of intimacy, and loneliness among sexual offenders. Criminal Justice and Behavior, 24(3), 315-331. Carl, L. C., & Lösel, F. (2021). When sexual offender treatment in prison-based social-therapeutic treatment is not completed: Relationship to risk factors and recidivism after release. Criminal Behaviour and Mental Health, 31(6), 421–435. Craig, L. A., Browne, K. D., Stringer, I., & Beech, A. (2005). Sexual recidivism: A review of dynamic and actuarial predictors. Journal of Sexual Aggression, 11(1), 65-84. Friendship, C., Mann, R. E., & Beech, A. R. (2003). Evaluation of a national prison-based treatment program for sexual offenders in England and Wales. Journal of Interpersonal Violence, 18(7), 744-759. Furby, L., Weinrott, M. R., & Blackshaw, L. (1989). Sex offender recidivism: A review. Psychological Bulletin, 105(1), 3-30. Hanson, R. K., Bourgon, G., Helmus, L., & Hodgson, S. (2009). The principles of effective correctional treatment also apply to sexual offenders. Criminal Justice and Behavior, 36, 865–891. Hanson, R. K., & Bussière, M. T. (1998). Predicting relapse: A meta-analysis of sexual offender recidivism studies. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 66(2), 348-362. Hanson, R. K., & Harris, A. J. R. (2000). Where should we intervene? Dynamic predictors of sexual offense recidivism. Criminal Justice and Behavior, 27(1), 6-35. Hanson, R. K., & Morton-Bourgon, K. E. (2004). Predictors of sexual recidivism: An updated meta-analysis. Corrections Research, Public Safety and Emergency Preparedness Canada. Hanson, R. K., & Morton-Bourgon, K. E. (2005). The characteristics of persistent sexual offenders: A meta-analysis of recidivism studies. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 73(6), 1154-1163. Hanson, R. K., Steffy, R. A., & Gauthier, R. (1993). Long-term recidivism of child molesters. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 61(4), 646-652. Harkins, L., & Beech, A. R. (2007). A review of the factors that can influence the effectiveness of sexual offender treatment: Risk, need, responsivity, and process issues. Aggression and Violent Behavior, 12(6), 615-627. Harrison, J. L., O'Toole, S. K., Ammen, S., Ahlmeyer, S., Harrell, S. N., & Hernandez, J. L. (2020). Sexual offender treatment effectiveness within cognitive-behavioral programs: A meta-analytic investigation of general, sexual, and violent recidivism. Psychiatry, Psychology and Law, 27, 1–25. Lipsey, M. W. (1998). Juvenile delinquency treatment: A meta-analytic inquiry into the variability of effects. In T. D. Cook, H. Cooper, D. S. Cordray, H. Hartmann, L. V. Hedges, R. J. Light, T. A. Louis, & F. Mosteller (Eds.), Meta-analysis for explanation: A casebook (pp. 83-127). New York: Russell Sage. Makarios, M., Sperber, K. G., & Latessa, E. J. (2014). Treatment dosage and the risk principle: A refinement and extension. Journal of Offender Rehabilitation, 53, 334–350. Marques, J. K., Wiederanders, M., Day, D. M., Nelson, C., & van Ommeren, A. (2005). Effects of a relapse prevention program on sexual recidivism: Results from California’s Sex Offender Treatment and Evaluation Program (SOTEP). Sexual Abuse: A Journal of Research and Treatment, 17(1), 79-107. Marshall, W. L., & Barbaree, H. E. (1988). An outpatient treatment program for child molesters. In R. A. Prentky & V. L. Quinsey (Eds.), Sexual aggression: Current perspectives (pp. 137-151). New York: Annals of the New York Academy of Sciences. Marshall, W. L., Champagne, F., Sturgeon, C., & Bryce, P. (1997). Increasing the self-esteem of child molesters. Sexual Abuse: A Journal of Research and Treatment, 9(4), 321-333. McMurran, M., & McCulloch, A. (2007). Why don't offenders complete treatment? Prisoners' reasons for non-completion of a cognitive skills programme. Psychology, Crime & Law, 13, 345–354. Olver, M. E., Stockdale, K. C., & Wormith, J. S. (2011). A meta-analysis of predictors of offender treatment attrition and its relationship to recidivism. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 79, 6–21. Pithers, W. D., & Cumming, G. F. (1989). Can relapse be prevented? Initial outcome data from the Vermont Program for sexual aggressors. In D. R. Laws (Ed.), Relapse prevention with sex offenders (pp. 292-310). New York: Guilford. Schmucker, M., & Lösel, F. (2017). Sexual offender treatment for reducing recidivism among convicted sex offenders: A systematic review and meta-analysis. Campbell Systematic Reviews, 8. Sperber, K. G., Latessa, E. J., & Makarios, M. D. (2012). Examining the interaction between level of risk and dosage of treatment. Criminal Justice and Behavior, 40, 338–348. Thornton, D. (2002). Constructing and testing a framework for dynamic risk assessment. Sexual Abuse: A Journal of Research and Treatment, 14(2), 139-153.
Atendimento – Consultório
Telefone: 0 XX 11 3120-6896
E-mail: [email protected]
Endereço: Avenida Angélica, 2100. Conjunto 13
Condomínio Edifício da Sabedoria
CEP: 01228-200, Consolação – São Paulo

Médico psiquiatra. Professor Livre-Docente pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Foi Professor de Psiquiatria da Faculdade de Medicina do ABC durante 26 anos. Coordenador do Programa de Residência Médica em Psiquiatria da FMABC por 20 anos, Pesquisador do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria da FMUSP (GREA-IPQ-HCFMUSP) durante 18 anos e Coordenador do Ambulatório de Transtornos da Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC (ABSex) durante 22 anos. Tem correntemente experiência em Psiquiatria Geral, com ênfase nas áreas de Dependências Químicas e Transtornos da Sexualidade, atuando principalmente nos seguintes temas: Tratamento Farmacológico das Dependências Químicas, Alcoolismo, Clínica Forense e Transtornos da Sexualidade.