Os Sexual Killers (Assassinos Sexuais): Estudos Iniciais

(CONTEÚDO SENSÍVEL)

Reparei na menina da minha turma na escola. Ela era bonita. Masturbava-me pensando em tudo o que eu poderia fazer com ela… Até que um dia, enviei-lhe uma mensagem de uma pessoa fake pelo Instagram, dizendo que eu era fotógrafo e gostaria de conversar com ela antes de uma entrevista e possível contrato como modelo. Marcamos um encontro à tarde em um parque meio vazio da cidade naquela hora. Ela apareceu e eu a observei por alguns minutos por detrás de arbustos. Excitei-me muito com isso. Cheguei perto dela e ela me reconheceu. Nesse momento, dei-lhe uma pedrada no rosto e a arrastei para o mato. Rasguei as roupas dela, penetrei-a brutalmente e a esganei com toda a minha força e prazer…”

(Anônimo)

Excerto – A Violência Física e a Catástrofe Linguística

Uma análise dialógica desse discurso revela a complexidade das vozes sociais, ideológicas e éticas em conflito, bem como a natureza polifônica e heteroglóssica da narrativa. Toda enunciação é um ato social, carregado de valores e intenções, inserido em um contexto histórico e cultural específico. Nesse sentido, o discurso em questão pode ser examinado sob três perspectivas principais: a polifonia, a heteroglossia e a carnavalização.

Polifonia e Conflito de Vozes

O narrador constrói uma narrativa monológica, na qual sua voz domina sem espaço para a resposta ou a subjetividade da vítima. No entanto, mesmo nessa aparente unilateralidade, percebe-se a presença de outras vozes sociais internalizadas. A justificativa implícita para a violência (“ela era bonita”, “excitei-me muito”) ecoa discursos misóginos e reificantes da mulher, presentes em certos setores da sociedade. Essas vozes, embora não nomeadas, permeiam o discurso e revelam um diálogo oculto com normas culturais que perpetuam a violência de gênero. A ausência da voz da vítima — reduzida a um objeto de prazer e destruição — acentua o caráter autoritário do discurso, que nega a alteridade e a possibilidade de resposta.

Heteroglossia e Linguagem Social

A linguagem utilizada pelo narrador é marcada por registros distintos:

  1. O discurso da sedução e do fingimento (“fotógrafo”, “entrevista”, “contrato como modelo”) — que remete a uma fachada socialmente aceitável, quase profissional.

  2. O discurso da violência explícita (“murro no rosto”, “arrastei para o mato”, “esganei”) — que rompe abruptamente com a máscara civilizada, revelando uma brutalidade crua.

Essa heteroglossia evidencia a contradição entre a racionalização inicial (“marcamos um encontro”) e o impulso destrutivo final, demonstrando como a linguagem pode ser instrumentalizada para mascarar e, ao mesmo tempo, realizar a violência. O uso do Instagram como meio de aproximação também reflete a apropriação de tecnologias contemporâneas para fins perversos, mostrando como a linguagem digital pode ser cooptada por discursos de dominação.

Carnavalização e Inversão da Ordem

Bakhtin discute o carnaval como um espaço de inversão temporária das hierarquias sociais, onde o perigoso e o proibido são permitidos. Nesse caso, porém, não há a ambivalência regeneradora do riso carnavalesco, mas uma perversão dessa lógica: o narrador transforma o parque — um espaço público e supostamente seguro — em um palco de violência, onde as normas sociais são suspensas não para celebrar a vida, mas para consumar um ato de destruição. A “carnavalização” aqui é distorcida, pois não há reciprocidade nem liberação coletiva, apenas a imposição unilateral de poder.

A Ética do Discurso

Sob a ótica bakhtiniana, esse relato é um exemplo extremo de monologismo autoritário, onde uma voz suprime todas as outras, negando a alteridade e a possibilidade de diálogo. A linguagem, em vez de ser um meio de comunicação, torna-se um instrumento de dominação e desumanização. A análise revela como discursos misóginos e violentos se infiltram na linguagem cotidiana, utilizando-se de estratégias de sedução e falsa racionalidade para justificar a barbárie. Bakhtin nos lembra que a verdadeira comunicação pressupõe o reconhecimento do outro como sujeito — algo radicalmente negado nessa narrativa.

Assim, o discurso analisado não é apenas uma descrição de violência, mas um ato de violência linguística, onde a palavra serve para silenciar, aniquilar e perpetuar uma lógica de poder que nega a dialogicidade essencial da existência humana.

A Sonoridade do Discurso

A análise da sonoridade em um texto como este, que descreve uma cena de violência extrema, deve considerar não apenas os aspectos fonéticos e rítmicos, mas também o impacto emocional e psicológico que a combinação de sons pode provocar no leitor. O texto em questão possui uma cadência que alterna entre frases curtas e incisivas e construções mais longas, criando um ritmo que pode ser lido como tenso e acelerado, refletindo a progressão da narrativa em direção ao clímax violento.

Do ponto de vista fonético, há uma predominância de consoantes oclusivas e fricativas (como /p/, /t/, /d/, /g/, /s/, /z/), que conferem um caráter abrupto e agressivo ao discurso. Palavras como “pedrada”, “rasguei”, “penetrei”, “esganei”e “força” possuem sons guturais e explosivos, reforçando a brutalidade das ações descritas. A repetição de vogais abertas (/a/, /e/) em termos como “arrastei”, “rasguei”, “brutalmente” também contribui para uma sensação de crueza e violência física.

Além disso, o uso de verbos no pretérito perfeito (“reparei”“masturbava-me”, “enviei”“marquei”“observei”“cheguei”, “dei”“arrastei”, “rasguei”“penetrei”, “esganei”) cria uma sensação de ação concluída, como se o narrador estivesse rememorando os eventos com frieza, sem espaço para arrependimento ou hesitação. A ausência de metáforas ou linguagem poética contribui para um tom direto e chocante, intensificando o desconforto do leitor.

Por fim, a alternância entre frases mais curtas (“Ela era bonita.”,”Excitei-me muito com isso.”) e períodos mais longos (“Marcamos um encontro à tarde em um parque meio vazio da cidade naquela hora.”) gera um efeito de suspense e aceleração narrativa, culminando na descrição do ato final, onde a sonoridade áspera e a crueza lexical se fundem para produzir um impacto visceral.

OBS.: É importante destacar que, embora esta análise do discurso seja técnica, o conteúdo do texto é profundamente perturbador e criminoso. A violência sexual e o assassinato são crimes graves, e discursos que os glorifiquem podem ter implicações legais e psicológicas sérias.

Introdução

Os assassinos sexuais representam um dos fenómenos criminais mais complexos e perturbadores, cuja compreensão exige uma abordagem interdisciplinar que integre perspectivas psicológicas e criminológicas. De acordo com Schlesinger (2007), o homicídio sexual é definido como um ato de violência letal em que o assassinato em si é sexualmente motivado, seja pela fusão entre agressão e excitação sexual, seja por conflitos sexuais subjacentes que desencadeiam o comportamento violento. No entanto, a definição precisa desse tipo de crime é desafiadora, pois não há consenso estatutário ou diagnóstico nos manuais de saúde mental, como o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM), que o classifique como uma parafilia específica (Schlesinger, 2007).

A prevalência de homicídios sexuais é difícil de determinar devido à falta de dados nacionais consistentes e à ambiguidade na definição do crime. Enquanto alguns países, como o Canadá, registram homicídios ocorridos durante crimes sexuais, essa abordagem exclui casos em que a motivação sexual não é acompanhada por manifestações genitais explícitas (Schlesinger, 2007). Nos Estados Unidos, estimativas sugerem que os homicídios sexuais são eventos raros, representando uma pequena fração dos homicídios totais. Ressler, Burgess e Douglas (1988) argumentam que a diminuição nas taxas de resolução de homicídios e o aumento de assassinatos sem motivos aparentes podem indicar um crescimento de homicídios sexuais, especialmente os cometidos por serial killers. No entanto, Schlesinger (2001) contestou essa visão, apontando que a redução no número de vítimas mulheres — alvo predominante de assassinos sexuais — não sustenta a hipótese de um aumento significativo desse tipo de crime.

Um Pouco de História…

Richard von Kraft-Ebing, psiquiatra austríaco do século XIX, é amplamente reconhecido por suas contribuições ao estudo das psicopatologias sexuais, especialmente através de sua obra seminal, Psychopathia Sexualis (1886). Embora o termo “assassino sexual” não fosse utilizado na sua época, Kraft-Ebing descreveu casos que hoje seriam classificados nessa categoria, explorando as motivações e características psicológicas desses indivíduos.

Kraft-Ebing abordou esses casos no contexto de “desvios sexuais”, que ele entendia como manifestações patológicas ligadas a distúrbios mentais ou degenerações hereditárias. Ele descreveu indivíduos que cometiam crimes sexuais violentos, muitas vezes associados às práticas de sadismo sexual e necrofilia. Em suas análises, ele destacava a conexão entre a excitação sexual e a violência, sugerindo que alguns criminosos experimentavam prazer sexual ao infligir dor ou dominar suas vítimas até a morte.

Uma das suas hipóteses centrais era a ideia de que esses comportamentos extremos resultavam de uma “degeneração” neurológica ou psíquica, frequentemente agravada por fatores como hereditariedade, alcoolismo e/ou traumas infantis. Ele via o sadismo, por exemplo, como uma perversão em que o impulso sexual se misturava com a crueldade extrema, levando o indivíduo a buscar satisfação em atos violentos. Em alguns casos, essa violência podia escalar para homicídios seriais, nos quais o assassino repetia os crimes para reviver a excitação associada ao ato.

Kraft-Ebing também discutia o papel das fantasias sexuais nesses crimes, observando que muitos criminosos planejavam meticulosamente seus atos, alimentados por um imaginário erótico repleto de agressividade. Ele notava que, uma vez iniciado o ciclo de violência, a compulsão para repetir o crime podia se tornar incontrolável, caracterizando um padrão serial.

Embora suas explicações fossem limitadas pelo conhecimento científico de sua época — especialmente a ênfase na “degeneração” como causa principal —, suas descrições detalhadas de casos reais forneceram uma base importante para o estudo posterior da psicopatologia criminal. Sua obra ajudou a estabelecer a ideia de que crimes sexuais violentos não eram simples atos de maldade, mas sim manifestações de transtornos mentais graves, um conceito que influenciou tanto a psiquiatria forense quanto a criminologia moderna.

A visão de Richard von Kraft-Ebing sobre os assassinos sexuais, denominados por ele de lust murderers, é profundamente enraizada em sua compreensão das perversões sexuais como manifestações patológicas da sexualidade humana. Kraft-Ebing explora a conexão entre violência e prazer sexual, argumentando que esses crimes extremos resultam de uma combinação de hiperestesia sexual (excitação excessiva) e parafilias sádicas, nas quais o ato de infligir dor ou morte torna-se um estímulo essencial para a gratificação sexual (Kraft-Ebing, 1886/2011).

Kraft-Ebing descreve os lust murderers como indivíduos que experimentam um prazer intenso e mórbido ao dominar, mutilar ou assassinar suas vítimas, frequentemente associando esses atos a fantasias sexuais bem elaboradas. Ele enfatiza que tais comportamentos não são apenas criminosos, mas sim sintomas de uma psicopatologia subjacente (Kraft-Ebing, 1886/2011). Casos como o de Jack, o Estripador, e outros assassinos em série são citados como exemplos paradigmáticos em que a crueldade e o erotismo se fundem.

Este autor também destaca o componente fetichista presente em muitos lust murderers, observando que partes específicas do corpo das vítimas—como genitais ou órgãos internos—podem ser alvo de fixação, servindo como símbolos de poder e prazer (Kraft-Ebing, 1886/2011). Essa perspectiva antecipou conceitos modernos da criminologia, como a ideia de signature em crimes seriais, onde a mutilação ou a disposição do corpo refletem necessidades psicológicas únicas do agressor.

Kraft-Ebing ainda discute a incapacidade desses indivíduos de controlar seus impulsos devido a uma falha nos mecanismos morais e cognitivos, frequentemente agravada por condições como personalidade profundamente arranhada ou “insanidade moral” (Kraft-Ebing, 1886/2011). Sua abordagem, embora antiga em termos de terminologia, estabeleceu as bases para a compreensão contemporânea da psicopatologia sexual, influenciando teóricos como Freud e os estudos modernos sobre as parafilias violentas.

Antes do século XIX, a história documentou alguns casos notórios de assassinos em série e criminosos sexuais. Aqui estão alguns exemplos:

    1. Gilles de Rais (1405-1440): Um ex-comandante militar francês que, após derrotar os ingleses na Guerra dos Cem Anos, foi acusado de assassinar e estuprar várias crianças.

    2. Elizabeth Báthory (1560-1614): Nobre da Hungria, ela é famosa por supostamente torturar e assassinar várias jovens, com rumores de que estava buscando a imortalidade através de rituais sanguinários.

    3. Hulda G. (século XV): Uma mulher acusada de ser uma assassina de homens através de envenenamento e possivelmente envolvidos em escândalos sexuais.

Esses casos refletem a combinação de violência, sexualidade e poder na dinâmica humana, e os crimes eram frequentemente atendidos com a percepção de vilania absoluta pela sociedade e pela documentação histórica da época.

Tipologia de Beech

A tipologia de Beech para assassinos sexuais, desenvolvida por Beech, Fisher e Ward (2005), busca classificar esses criminosos com base em suas teorias implícitas (ITs) e modus operandi, oferecendo uma compreensão profunda das motivações e comportamentos associados a esse tipo de crime. Essa classificação identifica três grupos distintos de assassinos sexuais, cada um com características psicológicas, padrões de comportamento e motivações específicas.

O primeiro grupo é composto por assassinos sexuais sádicos, que apresentam teorias implícitas como “o impulso sexual masculino deve ser satisfeito” (Beech et al., 2005). Esses indivíduos são impulsionados por fantasias sexuais sádicas e demonstram um forte desejo de controlar, dominar e matar suas vítimas (James & Proulx, 2016). Seu modus operandi é meticulosamente planejado, incluindo a seleção prévia de vítimas, geralmente desconhecidas, e a realização de uma variedade de atos sexuais e mutilações antes do assassinato (Ressler, Burgess & Douglas, 1988). A morte frequentemente ocorre por estrangulamento ou com o uso de objetos cortantes. Esse grupo é considerado o protótipo do assassino sexual em série, pois busca ativamente reproduzir suas fantasias na realidade, muitas vezes cometendo múltiplos crimes (Hazelwood & Warren, 2003).

O segundo grupo é formado por assassinos sexuais motivados por raiva, que compartilham a teoria implícita de “o mundo é perigoso” (Beech et al., 2005). Esses indivíduos são caracterizados por uma hostilidade intensa em relação às mulheres, frequentemente direcionada às vítimas conhecidas (Proulx & Beauregard, 2014). Seu modus operandi é marcado por violência excessiva e explosiva, muitas vezes desproporcional ao ato que desencadeou sua raiva (Meloy, 2000). A resistência da vítima tende a aumentar a brutalidade do ataque, resultando em mortes por espancamento ou uso múltiplo de armas. Diferentemente do primeiro grupo, esses assassinos não planejam seus crimes com antecedência, agindo de forma impulsiva e emocional (Knight, 1999). Eles também têm um histórico criminal mais diversificado, incluindo crimes não sexuais (James & Proulx, 2016).

O terceiro grupo é composto por assassinos sexuais oportunistas, que acreditam que “o impulso sexual masculino é incontrolável” (Beech et al., 2005). Esses indivíduos são movidos principalmente pelo desejo de gratificação sexual e não por fantasias sádicas ou raiva (Chan & Heide, 2009). Seus crimes são cometidos de forma oportunista, muitas vezes durante a prática de outros delitos, como roubos (Beauregard & Proulx, 2002). A violência é instrumental, visando a eliminar testemunhas ou facilitar a fuga, e o assassinato não é o objetivo principal. Eles geralmente não têm histórico de violência prévia contra mulheres e são considerados menos organizados em comparação ao primeiro grupo (Schlesinger, 2004).

A tipologia de Beech destaca a diversidade entre os assassinos sexuais, mostrando que suas ações são influenciadas por uma combinação de fatores psicológicos, emocionais e situacionais (Ward & Beech, 2006). Essa classificação não apenas auxilia na compreensão dos padrões comportamentais desses criminosos, mas também pode ser útil em investigações policiais, na avaliação de risco de reincidência e no desenvolvimento de estratégias de prevenção e tratamento (Kocsis, 2006). Ao reconhecer as diferenças entre os grupos, é possível abordar cada caso de forma mais precisa, considerando as motivações e circunstâncias específicas de cada criminoso.

Tipologia de Schlesinger

Semelhantemente à tipologia de Beeck, Schlesinger propôs uma categorização em apenas dois tipos principais: os homicidas sexuais catatímicos e os compulsivos.

Os homicídios catatímicos são caracterizados por uma explosão de violência desencadeada por conflitos sexuais subjacentes, muitas vezes relacionados a sentimentos de inadequação ou humilhação. Esse tipo de homicídio pode ser agudo, envolvendo um ataque súbito e desorganizado, ou crônico, marcado por um período de incubação em que o agressor desenvolve uma obsessão pela vítima antes de agir. Por exemplo, um caso típico de homicídio catatímico agudo envolve um indivíduo que, após ser provocado sexualmente, reage com violência extrema devido a sentimentos de impotência ou raiva (Schlesinger, 2007).

Por outro lado, os homicídios compulsivos são motivados por uma fusão entre agressão e excitação sexual, em que o ato de matar é intrinsecamente gratificante. Esses crimes podem ser planejados, como no caso de assassinos em série que elaboram rituais sádicos, ou não planejados, quando o agressor age de forma impulsiva diante de uma oportunidade. Um exemplo de homicídio compulsivo planejado é o de um assassino que tortura e mata vítimas para satisfazer fantasias sexuais elaboradas, muitas vezes desenvolvidas ao longo de anos (Schlesinger, 2007). Já os homicídios não planejados são frequentemente cometidos por indivíduos com transtornos de personalidade ou psicopatologias que dificultam o controle de impulsos.

A diferenciação entre os dois tipos é crucial para a investigação criminal e a avaliação forense. Enquanto os assassinos catatímicos geralmente têm uma relação prévia com a vítima ou agem sob um conflito específico, os compulsivos muitas vezes escolhem vítimas aleatórias, movidos por uma compulsão interna (Schlesinger, 2007). Além disso, os comportamentos pós-crime também diferem: os catatímicos podem mostrar remorso ou tentar suicídio, enquanto os compulsivos buscam evitar a captura para repetir outro crime.

Apesar da “raridade” dos homicídios sexuais, seu impacto devastador exige esforços contínuos para melhorar a identificação, prevenção e intervenção. Schlesinger (2007) destaca a importância de profissionais de saúde mental e da lei reconhecerem sinais de alerta, como fantasias sadistas, crueldade com animais e históricos de abusos, que podem indicar um potencial para violência extrema. Além disso, a colaboração entre psicólogos, psiquiatras e investigadores criminais é essencial para desenvolver estratégias eficazes de perfilagem criminal e avaliação de risco.

Os assassinos sexuais representam um desafio significativo para a justiça criminal e a saúde mental. A compreensão de suas motivações, comportamentos e características psicológicas é fundamental para prevenir futuras tragédias e garantir respostas adequadas do sistema judicial e de saúde.

Abaixo segue uma tabela comparativa detalhando as características dos dois principais tipos de assassinos sexuais, conforme proposto por Schlesinger (2007):

Tabela Comparativa: Assassinos Sexuais Catatímicos vs. Compulsivos

Característica

Assassinos Catatímicos

Assassinos Compulsivos

Definição

Homicídio desencadeado por conflitos sexuais subjacentes (ex.: inadequação, humilhação).

Homicídio motivado pela fusão de agressão e excitação sexual; o ato de matar é gratificante.

Subtipos

Agudo (explosão repentina)

Crônico (obsessão prolongada).

Planejado (ritualístico)

Não planejado (impulsivo).

Motivação

Alívio de tensão emocional ligada a conflitos sexuais ou relacionamentos.

Satisfação de fantasias sádicas ou compulsão interna para dominar/controlar.

Relação com a Vítima

Agudo: Geralmente desconhecidos.

Crônico: Parceiros íntimos ou conhecidos.

Planejado: Vítimas desconhecidas (aleatórias).

Não planejado: Conhecidas ou oportunas.

Planejamento

Agudo: Nenhum.

Crônico: Pode envolver stalking ou ruminação obsessiva.

Planejado: Elaborado (rituais, seleção de vítimas).

Não planejado: Espontâneo.

Cena do Crime

Desorganizado (violência excessiva, como overkill).

Organizado (métodos controlados, mutilações ritualísticas) ou caótico (se impulsivo).

Comportamento Sexual

Raro durante o crime; pode ocorrer necrofilia ou mutilação pós-morte.

Comum (estupro, tortura, atos fetichistas).

Estado Psicológico

Agudo: Dissociação, raiva intensa.

Crônico: Depressão, ideação suicida.

Planejado: Psicopata/narcisista.

Não planejado: Transtornos de personalidade (ex.: borderline).

Pós-Crime

Agudo: Confusão/amnésia.

Crônico: Alívio ou suicídio.

Planejado: Tenta evitar captura.

Não planejado: Pouca preocupação com evidências.

Exemplo Clássico

Homem que mata após ser rejeitado sexualmente (crise aguda).

Serial killers com sadismo sexual

Principais Diferenças

    1. Origem da Violência:

    • Catatímicos: Conflitos emocionais/sexuais mal resolvidos.

    • Compulsivos: Fantasias sadistas internalizadas e necessidade de dominação.

    1. Vítimas:

    • Catatímicos atacam quem os “desencadeia” (ex.: parceiros)

    • Compulsivos buscam vítimas que se encaixem em seus rituais.

    1. Recorrência:

    • Compulsivos têm alta reincidência (especialmente os planejados)

    • Catatímicos geralmente cometem crimes isolados.

 

O Papel do Imaginário Erótico e das Fantasias Sexuais entre Assassinos Sexuais

O imaginário erótico e as fantasias sexuais desempenham um papel central no comportamento dos assassinos sexuais, embora sua influência varie significativamente entre os tipos catatímicos compulsivos. Essas fantasias não apenas moldam a motivação para o crime, mas também orientam a execução, a seleção de vítimas e até mesmo os rituais pós-morte. A seguir, discute-se como esses elementos psicológicos se manifestam em cada perfil:

1. Fantasias nos Assassinos Compulsivos: O Combustível da Violência

Nos assassinos compulsivos, as fantasias sexuais são estruturantes e progressivas. Schlesinger (2007) destaca que esses indivíduos frequentemente desenvolvem, ao longo de anos, cenários mentais elaborados nos quais a dor, o controle e a morte do outro são erotizados. Características-chave incluem:

    • Fusão entre Sexo e Agressão: A excitação está intrinsecamente ligada ao ato violento, como evidenciado em serial killers, que muito amiúde descrevem o assassinato como o “clímax” de seu ritual (Ressler et al., 1988).

    • Ritualização: Fantasias incluem detalhes específicos (ex.: métodos de tortura, posicionamento do corpo), que são repetidos em cada crime (“assinatura”). Por exemplo, preservar partes do corpo das vítimas como forma de prolongar o controle sobre elas (Schlesinger, 2004).

    • Masturbação e Reforço: Muitos compulsivos masturbam-se repetidamente utilizando-se das suas fantasias sexuais sádicas, fortalecendo a compulsão até que a ação se torne inevitável (Burgess et al., 1986).

Caso Exemplar

Richard Ramirez, o “Night Stalker”, relatava que as suas fantasias masturbatórias envolviam violência extrema desde a sua adolescência, influenciadas por relatos de crimes reais e pornografia sádica (Revitch & Schlesinger, 1989).

2. Fantasias nos Assassinos Catatímicos: Conflito e Ruptura

Já nos catatímicos, o imaginário erótico é menos organizado e está associado a conflitos não resolvidos, como sentimentos de inadequação sexual ou medo de rejeição. Aqui, as fantasias não são o motor primário do crime, mas sim a incapacidade de lidar com emoções disparadas pela vítima. Aspectos relevantes:

    • Simbolismo da Vítima: A agressão é direcionada a quem representa a fonte da humilhação (ex.: uma mulher que rejeita o assassino pode simbolizar todas as rejeições passadas). Wertham (1937) descreveu isso como “crise catatímica”.

    • Ausência de Ritual: Diferentemente dos compulsivos, não há fantasias prévias detalhadas. O ato é uma resposta explosiva a um gatilho imediato (ex.: insulto durante uma tentativa de relação sexual).

    • Dissociação: Muitos catatímicos relatam memórias fragmentadas do crime, como se estivessem “fora do corpo” (Schlesinger, 2007).

Caso Exemplar

No caso de A. A. (citado por Schlesinger, 2007), o assassino estrangulou uma mulher após falhar sexualmente com ela, mas só conseguiu ter relações após sua morte (necrofilia), sugerindo que a violência “neutralizou” sua ansiedade.

3. Implicações para a Investigação e Prevenção

  • Perfilamento Criminal: Crimes de compulsivos deixam marcas de ritualismo (ex.: objetos inseridos, padrões de mutilação), enquanto catatímicos apresentam cenas desorganizadas com violência excessiva (Douglas et al., 1986).

  • Intervenção Precoce: Fantasias sádicas em adolescentes (ex.: tortura de animais) são sinais de alerta para compulsivos; já catatímicos podem revelar ideação homicida em terapia, mas sem fantasias estruturadas (Meloy, 2000).

Enquanto o imaginário erótico dos compulsivos é proativo (alimenta a busca por vítimas), nos catatímicos ele é reativo (responde a conflitos internos). Essa distinção é crucial para entender a psicopatologia subjacente e desenvolver estratégias de prevenção diferenciadas.

Esta análise revela como o mesmo elemento (fantasia sexual) pode servir a dinâmicas psicológicas radicalmente diferentes, exigindo abordagens distintas na justiça criminal e na clínica forense.

Palavras Finais

O estudo dos assassinos sexuais revela uma complexa interação entre fatores psicológicos, sociais e criminais, que moldam comportamentos violentos e destrutivos. A análise apresentada no texto destaca a importância de compreender as motivações e os processos mentais desses criminosos, seja através das tipologias de Beech e Schlesinger (dentre outras mais recentes), seja pela exploração histórica de casos como os descritos por Kraft-Ebing. Esses modelos demonstram que os assassinos sexuais não constituem um grupo homogêneo, mas sim têm perfis distintos, cada um com suas próprias dinâmicas de ação, motivações e padrões de violência.

A tipologia de Beech, por exemplo, diferencia os assassinos em três grupos — sádicos, motivados por raiva e oportunistas —, enfatizando como teorias implícitas e fantasias sexuais influenciam seus crimes. Já a categorização de Schlesinger em assassinos catatímicos e compulsivos reforça a ideia de que a violência pode surgir tanto de imperativos emocionais destrutivos quanto de compulsões internas alimentadas por fantasias sádicas. Essas distinções são cruciais não apenas para a investigação criminal, mas também para a avaliação de risco de reincidência e para o desenvolvimento de estratégias de prevenção e intervenção.

Além disso, a análise discursiva do relato anônimo ilustra como a linguagem pode ser instrumentalizada para validar e perpetuar a violência, revelando a presença de vozes sociais internalizadas que ecoam discursos misóginos e desumanizadores. A análise do discurso do “anônimo” evidencia a natureza polifônica e heteroglóssica dessas narrativas, mostrando como a violência linguística se entrelaça com a física, silenciando a vítima e reforçando estruturas de poder.

Historicamente, figuras como Kraft-Ebing pavimentaram o caminho para a compreensão moderna desses crimes, ao associá-los a psicopatologias e parafilias, enquanto casos antigos, como os de Gilles de Rais e Elizabeth Báthory, mostram que a fusão entre violência, sexualidade e poder não é um fenômeno recente. Esses exemplos históricos, somados aos estudos contemporâneos, reforçam a necessidade de uma abordagem interdisciplinar que integre psicologia, criminologia e análise social.

Em síntese, o texto sublinha a importância de reconhecer a diversidade e a complexidade dos assassinos sexuais, evitando generalizações simplistas. A compreensão aprofundada desses fenômenos é essencial para avançar tanto no campo da justiça criminal quanto no tratamento e na prevenção, sempre com o objetivo de proteger a sociedade e mitigar futuras tragédias. A colaboração entre profissionais de diferentes áreas — incluindo psicólogos, psiquiatras, investigadores e juristas — é fundamental para enfrentar os desafios impostos por esses crimes e promover respostas mais eficazes e humanizadas.

Referências

Beauregard, E., & Proulx, J. (2002). Profiles in the offending process of nonserial sexual murderers. International Journal of Offender Therapy and Comparative Criminology, 46(4), 386-399.

Beech, A. R., Fisher, D., & Ward, T. (2005). Sexual murderers’ implicit theories. Journal of Interpersonal Violence, 20(11), 1366-1380.

Burgess, A. W., Hartman, C. R., & Ressler, R. K. (1986). Sexual homicide: A motivational model. Journal of Interpersonal Violence, 1(3), 251-272.

Chan, H. C. O., & Heide, K. M. (2009). Sexual homicide: A synthesis of the literature. Trauma, Violence, & Abuse, 10(1), 31-54.

Hazelwood, R. R., & Warren, J. I. (2003). Linkage analysis: Modus operandi, ritual, and signature in serial sexual crime. Aggression and Violent Behavior, 8(3), 307-318.

James, J., & Proulx, J. (2016). A systematic review of the characteristics of serial and nonserial sexual murderers. Aggression and Violent Behavior, 31, 200-218.

Knight, R. A. (1999). Validation of a typology for rapists. Journal of Interpersonal Violence, 14(3), 303-330.

Kocsis, R. N. (2006). Criminal profiling: Principles and practice. Humana Press.

Kraft-Ebing, R. von. (2011). Psychopathia Sexualis. (Tradução baseada na 12ª edição alemã de 1886). Rebmans Company. (Original publicado em 1886).

Meloy, J. R. (2000). The nature and dynamics of sexual homicide. Aggression and Violent Behavior, 5(1), 1-22.

Proulx, J., & Beauregard, E. (2014). Pathways in the offending process of extrafamilial sexual aggressors against women. In Pathways to sexual aggression (pp. 71-109). Routledge.

Ressler, R. K., Burgess, A. W., & Douglas, J. E. (1988). Sexual homicide: Patterns and motives. Free Press.

Schlesinger, L. B. (2001). Is serial homicide really increasing? Journal of the American Academy of Psychiatry and the Law, 29(3), 294–297.

Schlesinger, L. B. (2004). Sexual murder: Catathymic and compulsive homicides. CRC Press.

Schlesinger, L. B. (2007). Sexual homicide: Differentiating catathymic and compulsive murders. Aggression and Violent Behavior, 12(3), 242–256.

Ward, T., & Beech, A. R. (2006). An integrated theory of sexual offending. Aggression and Violent Behavior, 11(1), 44-65.

Wertham, F. (1937). The catathymic crisis. Archives of Neurology and Psychiatry, 37(4), 974-977.

 

Atendimento – Consultório

Telefone: 0 XX 11 3120-6896
E-mail: dbaltieri@uol.com.br

Endereço: Avenida Angélica, 2100. Conjunto 13
Condomínio Edifício da Sabedoria
CEP: 01228-200, Consolação – São Paulo

Deixe uma resposta