Tanto quem usou crystal uma única vez quanto o usuário recorrente podem ter flashbacks
Resposta
O Crystal (Metanfetamina) é uma substância psicoativa excitatória do Sistema Nervoso Central com alto potencial para induzir abuso ou mesmo síndrome de dependência. Tem sido utilizado em larga escala ao redor do mundo, com uma prevalência de uso na vida estimada de 1,5 a 2% entre adultos jovens. Nos Estados Unidos da América, há, anualmente, cerca de 15 mil mortes devido ao uso da metanfetamina e de outros estimulantes.
O uso desta substância pode ocorrer através de diferentes vias de administração, tais como fumada, inalada, injetada e na forma de comprimidos. Quando inalada, os efeitos iniciam entre 2 e 5 minutos; quando tomada via oral, os efeitos iniciam entre 10 e 20 minutos. As reações imediatas são muitas vezes prazerosas e, por isso, provocadoras do uso repetitivo. Além disso, como dito, o “high” causado pelo uso da droga inicia-se rapidamente mas também termina rapidamente, o que propicia, em uma mesma noite, a repetição do uso.
Principais efeitos agudos e nefastos do uso do Crystal
a) prejuízos no sono (insônia por dias seguidos)
b) redução do apetite
c) respiração rápida e curta
d) arritmias cardíacas
e) aumento da temperatura corporal
f) aumento da pressão arterial
g) alucinações
h) sintomas paranoides
i) convulsões
j) movimentos musculares involuntários
k) desidratação
l) confusão mental
m) sudorese profusa.
Uso recorrente da droga traz sintomas ainda mais preocupantes
Os sintomas abaixo tendem a aparecer e provocar imensuráveis prejuízos ao usuário, tais como:
a) extrema perda de peso
b) falhas da memória
c) problemas dentários (por bruxismo, por exemplo). Existe um quadro descrito como “boca de Crystal”, caracterizada pela perda progressiva dos dentes;
d) coceiras intensas pelo corpo, com consequentes escoriações da pele
e) comportamento irritável ou mesmo violento
f) problemas de insônia persistentes
g) síndrome de dependência
h) disfunção do sistema imunológico
i) sintomas psicóticos, como alucinações e delírios persistentes
j) dificuldade para urinar
k) problemas hepáticos
l) cheiro desagradável no suor e corpo.
De fato, as mais notáveis consequências do consumo do Crystal (Metanfetamina) entre usuários (sem outros transtornos mentais prévios) são os sintomas paranoides (sentir-se perseguido), as alucinações visuais, as ilusões visuais, o comportamento agressivo, a irritabilidade e a insônia persistente.
O usuário recorrente do Crystal pode também, infelizmente, apresentar os famigerados sintomas da síndrome de abstinência, quando ele cessa o uso por algum tempo.
Síndrome de abstinência: sintomas
a) Fadiga intensa
b) Dores pelo corpo
c) Humor deprimido
d) Ansiedade
e) Irritabilidade
f) Náuseas e vômitos.
Transtorno Perceptual Persistente ou flashbacks
Tanto o usuário de uma única vez quanto o usuário recorrente podem apresentar um quadro conhecido como Transtorno Perceptual Persistente, ou flashbacks. Os flashbacks tendem a ocorrer mais amiúde durante situações de estresse psicológico ou físico, mesmo sem o uso recente do Crystal. Uma possível explicação para tal fenômeno, conhecido popularmente como flashbacks, seria o aumento na sensibilidade a estímulos estressantes, provocado por alterações em vias noradrenérgicas e dopaminérgicas cerebrais. Situações estressantes podem ser aqui definidas como problemas físicos e/ou psicológicos que demandam alguma reação do indivíduo.
Estudos têm mostrado que, durante os episódios de flashbacks, os usuários apresentam aumento nas concentrações sanguíneas de um dos metabólitos da Norepinefrina, especialmente do 3-MT (3-metoxi-tiramina), o que sugere fortemente lesões funcionais nos sistemas regulatórios de neurosubstâncias (principalmente Norepinefrina, Dopamina e Serotonina) ocorridas durante o consumo da droga.
Principais estímulos desencadeadores do transtorno perceptual persistente (flashback) reportados por usuários:
a) conflitos com amigos e parceiros
b) receio de algum tipo de punição
c) ser afrontado por terceiros
d) eventos estressantes no trabalho ou mesmo em casa
e) isolamento social.
Os problemas com o uso do Crystal vão muito além dos flashbacks. Usuários recorrentes tendem também a exaurir os seus sistemas serotoninérgicos cerebrais, provocando síndromes depressivas recorrentes e, por vezes, graves.
Os flashbackers, comumente, apresentam episódios de revivescência das experiências ruins vividas durante o uso da droga. Estes episódios de alterações perceptuais ocorrem de forma intermitente, ou seja, existe um intervalo variável entre um e outro episódio. Estes episódios tendem a permanecer por longo tempo, variando entre 1 e 5 anos após o último uso do Crystal.
Flashbacks podem ocorrer por anos
As notícias não são boas. Os flashbacks induzidos pelo uso da droga Crystal tendem a ocorrer intermitentemente por alguns anos. No entanto, existem formas de tratamento medicamentoso e através de psicoterapia específica que podem ajudá-lo tanto na redução da intensidade dos sintomas quanto no aprendizado de técnicas para controlá-los melhor.
Você deve procurar um profissional psiquiatra especializado. Digo isso, porque certas medicações podem piorar o seu quadro, enquanto outras podem ajudar.
Dicas importantes para a sua recuperação
a) conte sobre este problema para pessoas que se preocupam com você de verdade
b) evite contato com outros usuários
c) faça uma faxina na sua casa, retirando qualquer tipo de parafernália que o remeta ao uso da droga. Se você tiver uma pessoa de confiança (e não usuária) para ajudá-lo durante esta limpeza, convide-a
d) evite situações de ociosidade. Ocupe-se
e) tente modificar a sua rotina. Pratique atividades esportivas salutares, alimente-se adequadamente
f) faça um checkup médico
g) não use outras substâncias psicoativas
h) estabeleça metas precisas e objetivas, tanto que a concretização lhe traga sensação de recompensa.
Não perca tempo!!!
Atenção! Esta resposta (texto) não substitui uma consulta ou acompanhamento de um médico psiquiatra e não se caracteriza como sendo um atendimento.
Médico psiquiatra. Professor Livre-Docente pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Atualmente é Professor Assistente da Faculdade de Medicina do ABC, Coordenador do Programa de Residência Médica em Psiquiatria da FMABC, Pesquisador do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria da FMUSP (GREA-IPQ-HCFMUSP) e Coordenador do Ambulatório de Transtornos da Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC (ABSex). Tem experiência em Psiquiatria Geral, com ênfase nas áreas de Dependências Químicas e Transtornos da Sexualidade, atuando principalmente nos seguintes temas: Tratamento Farmacológico das Dependências Químicas, Alcoolismo, Clínica Forense e Transtornos da Sexualidade.