Medicações benzodiazepínicas devem ser prescritas com bastante critério
No final da década de 70, os benzodiazepínicos (diazepam, clonazepam, lorazepam, alprazolam, bromazepam etc) tornaram-se as medicações mais frequentemente prescritas ao redor do mundo.
As variadas indicações para usar este grupo de medicações – sedativos/hipnóticos, ansiolíticos, anticonvulsivantes, relaxamento muscular -, baixa toxicidade (quando comparada às outras medicações com atividades similares na época), e uma presumida falta de potencial para causar dependência, estimularam as prescrições e o uso continuado. No início da década de 80, usuários deste grupo de medicações perceberam que precisavam de doses maiores para atingir os efeitos anteriores, bem como tinham dificuldades para interromper o uso da droga, devido a sintomas relacionados à retirada. De fato, a tolerância aos benzodiazepínicos ocorre com praticamente todos os quadros clínicos para os quais este grupo de medicações é prescrito; entretanto, parece ocorrer muito discreta tolerância para os efeitos deletérios dos benzodiazepínicos sobre a memória, atenção, habilidade visuo-espacial e outras funções cognitivas.
É importante registrar que a gravidade dos sintomas da síndrome de abstinência aos benzodiazepínicos dependerá: do tempo de uso, do escalonamento da dose, do tempo de ação da droga, e de características intrínsecas do usuário, como traços de personalidade. Os sintomas de abstinência comumente dificultam de forma evidente a retirada dessa medicação, especialmente entre usuários prolongados.
A população que se torna dependente dos benzodiazepínicos é bastante heterogênea. Mas, de forma didática, podemos vislumbrar três grupos de dependentes:
Dependentes de doses terapêuticas
Quadro também conhecido como “dependência fisiológica. Este grupo corresponde à grande maioria dos portadores do quadro de dependência. Trata-se principalmente daqueles indivíduos que recebem prescrições regulares deste grupo de medicações para o tratamento da ansiedade e outras condições psiquiátricas e neurológicas. Frequentemente, esses indivíduos não aumentam as doses por conta própria, mas têm importante dificuldade para reduzir ou cessar o consumo da droga, devido aos sintomas de retirada.
Dependentes de altas doses
Uma minoria dos pacientes para quem são prescritas tais medicações escalonam as doses. Comumente, convencem seus médicos sobre a necessidade do aumento da dose até o limite permitido. Quando o médico recusa a prescrição dessas doses, comumente esses pacientes buscam outras fontes da substância, como pronto-socorro, outros médicos, e até mesmo procurando a substância no mercado negro.
Usuários recreativos de benzodiazepínicos
Frequentemente, esses usuários também consomem outras drogas, como cocaína, anfetaminas, álcool, opioides etc. Uma das razões para esse uso concomitante é o automanejo de sintomas de abstinência (no caso do alcoolismo, por exemplo) e diminuição dos sintomas da intoxicação (no caso da cocaína, por exemplo), dentre outras. Outrossim, existem aqueles que abusam apenas dos benzodiazepínicos.
É necessário identificar qual é o tipo de dependência instalada e iniciar o tratamento médico e psicossocial adequado. Existem medicações que têm sido testadas e utilizadas para auxiliar a retirada gradual das medicações benzodiazepínicas de dependentes. Um profissional especializado procurará identificar o problema e iniciar o tratamento, que comumente é prolongado e requer esforço da equipe de saúde e do portador do quadro de dependência.
Medicações benzodiazepínicas devem ser prescritas com bastante cautela e criteriosamente. Sempre que possível, o seu uso deve ser por tempo limitado e curto, objetivando impedir o surgimento de quadros de dependência.
Médico psiquiatra. Professor Livre-Docente pelo Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Atualmente é Professor Assistente da Faculdade de Medicina do ABC, Coordenador do Programa de Residência Médica em Psiquiatria da FMABC, Pesquisador do Grupo Interdisciplinar de Estudos de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria da FMUSP (GREA-IPQ-HCFMUSP) e Coordenador do Ambulatório de Transtornos da Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC (ABSex). Tem experiência em Psiquiatria Geral, com ênfase nas áreas de Dependências Químicas e Transtornos da Sexualidade, atuando principalmente nos seguintes temas: Tratamento Farmacológico das Dependências Químicas, Alcoolismo, Clínica Forense e Transtornos da Sexualidade.