Mãe usuária de cocaína e aleitamento materno

mãe

Como lidar com esse dilema?

E-mail enviado por uma leitora

“Uso cocaína de vez quando, mas suspendo a amamentação, descarto o leite por 24 horas depois volto a amamentar será que ofereço algum risco pra minha bebê?”

Resposta

A cocaína é uma substância excitatória do Sistema Nervoso Central com ação rápida e com característica de célere indução de quadros de síndrome de dependência. Através das suas atividades noradrenérgicas, serotoninérgicas e dopaminérgicas (dentre outras), a cocaína provoca vários efeitos imediatos no corpo do usuário.

5 efeitos da cocaína no organismo

1) aumento da pressão arterial e frequência cardíaca;
2) falta de sono e de apetite;
3) sensação de euforia, confiança;
4) inobservância de regras sociais e familiares;
5) perda da autocrítica.

Outrossim, o uso desta substância está associado com uma miríade de consequências negativas para diversos tecidos orgânicos, veja.

4 consequências negativas do consumo de cocaína

1ª) aumentado risco de contrair doenças infecciosas;
2ª) má nutrição;
3ª) complicações gastrintestinais;
4ª) eventos cardiovasculares (por exemplo, infarto miocárdico, arritmias cardíacas, acidentes vasculares cerebrais etc).

Todas estas complicações afetam diretamente a mãe e os seus filhos, tanto que todos sabem que “a maternidade não combina com o uso de substâncias psicoativas.”
Apesar disso, estima-se que entre 5 e 10% das mulheres grávidas na América do Norte abusam de cocaína e algumas destas mulheres desejam amamentar seus filhos. É fato que a amamentação, tanto para a mãe quanto para o bebê, é um ato altamente benéfico.

Benefícios do aleitamento materno

a) redução da morbidade e mortalidade infantil;
b) melhor funcionamento cognitivo dos infantes;
c) redução do risco de doenças infecciosas e das moduladas pelo sistema imunológico nas crianças;
d) possibilidade de estreitar o apego afetivo mãe/neonato.

Outrossim, para as mães que amamentam, parece haver, em longo prazo, vários benefícios tais como:

a) redução do risco de doenças cardiovasculares;
b) redução do risco de Diabetes mellitus;
c) redução do risco de neoplasias mamárias e ovarianas.

Mães usuárias de cocaína e amamentação

Quando mães usuárias de cocaína desejam amamentar seus filhos, trata-se de um enorme desafio clínico e legal. É importante balancear os riscos e benefícios do ato de amamentar entre tais mulheres.

Como regra geral, as mães deveriam estar sob tratamento médico e psicossocial antes mesmo de tornarem-se grávidas, a fim de não promover os inúmeros problemas provocados pelo uso da cocaína sobre seu filho. Muitas vezes, a amamentação deve ser desencorajada, principalmente entre mães usuárias recorrentes de cocaína.

Maternidade não combina com uso de substâncias psicoativas
Maternidade não combina com uso de substâncias psicoativas

Existem registros nos gêneros textuais médicos sobre a medição da cocaína no leite materno, logo após a inalação da droga pelas mães. A cocaína presente na circulação sanguínea materna passa para o leite materno em quantidades significativas para lesar o neonato. A cocaína presente no leite materno será, então, absorvida oralmente pela criança e metabolizada no sistema gastrointestinal. No entanto, dado que a capacidade metabólica do neonato para metabolizar e eliminar substâncias tóxicas não é plenamente desenvolvida, a exposição à cocaína pode persistir e causar danos consideráveis.

Algumas consequências para o neonato que consome leite materno contaminado com cocaína podem ser citadas.

5 consequências para o bebê que consome leite materno contaminado com cocaína

1ª) crises convulsivas;
2ª) hipertensão arterial;
3ª) taquicardia;
4ª) agitação;
5ª) irritabilidade.

Mulheres usuárias que desejam amamentar, devem fazer o quê?

Para as mulheres usuárias recorrentes de cocaína que, mesmo assim, desejam amamentar seus neonatos, existe a necessidade imperativa de estarem submetidas a tratamento médico e psicossocial especializado objetivando a parada do consumo da droga durante todo o período de amamentação. É óbvio que tal período deveria ser alargado por toda a vida.

Durante o tratamento, as mães usuárias devem receber informações claras sobre os enormes riscos para os seus filhos (e para elas mesmas) sobre o consumo de cocaína.

Estudos

Existem, porém, alguns estudos que avaliam a possibilidade da amamentação entre mães usuárias recreativas (e NÃO recorrentes) da cocaína. Tais estudos embasam-se na importância da amamentação para a mãe e o filho, como apontado acima neste texto.

Estes estudos, muitos amparados pela Sociedade de Obstetrícia e Ginecologia do Canadá, recomendam que a decisão para amamentar deve ser realizada de forma individualizada, após ampla discussão a respeito dos riscos e benefícios.

Nos casos de mães usuárias esporádicas, estes estudos aconselham

a) deve haver evidência de que o consumo da droga não seja recorrente;
b) após o uso recreativo da cocaína, o leite deve ser descartado nas 24 horas seguintes.

Apesar destas considerações, é muito difícil apoiar tais critérios, sendo os mesmos inclusive perigosos. Por que perigosos?

a) porque, muito amiúde, estas mães não estão sendo supervisionadas quanto ao uso da droga;
b) porque muitas destas mães não estão sob tratamento médico e psicossocial para eliminar este uso pernicioso;
c) porque há enormes variabilidades no metabolismo entre as mães.

Portanto, prefiro a regra geral: se estiver usando cocaína, procure imediatamente um tratamento especializado e cesse o uso da droga. Quando cessar e não houver qualquer concentração sanguínea de cocaína no corpo materno, a amamentação pode ser aventada.

Você já está causando prejuízos sérios para si mesma. Não faça o mesmo com o seu filho.

Abaixo, forneço referência sobre esta resposta:

Cressman AM, Koren G, Pupco A, Kim E, Ito S, Bozzo P. (2012). Maternal cocaine use during breastfeeding. Canadian Family Physician, 58: 1218-19.
Atenção!

Este texto não substitui uma consulta ou acompanhamento de um médico psiquiatra e não se caracteriza como sendo um atendimento.

 

Artigo Original