Alegar doença é comum entre pedófilos que são descobertos

R7

Professor preso por produzir e armazenar imagens de crianças e adolescentes em São Paulo afirmou em depoimento que precisava de ajuda

Preso esta semana com um grande acervo de pornografia infantil, o professor de uma escola de elite em São Paulo, de 53 anos, disse ao delegado que estava doente e precisava de ajuda.

Na casa do homem, os policiais encontraram microcâmeras dentro de caixas de remédios, que eram usadas para gravar partes íntimas de alunas de 10 a 14 anos, afirmam os investigadores.

Embora o transtorno pedofílico seja considerado uma doença, são raros aqueles que buscam ajuda antes de serem descobertos por familiares ou até mesmo presos, como foi o caso do professor.

O psiquiatra Danilo Baltieri, que estuda esse tema há 30 anos e já atendeu cerca de 2.000 pacientes com transtorno pedofílico, explica que afirmações como a desse professor são comuns.

“Após serem descobertos, muitos querem usar a doença como desculpa, infelizmente. Outros acabam realmente falando que não dá mais, que precisam parar e querem o tratamento. Mas é preciso avaliar rigorosamente: essa pessoa quer mesmo se tratar ou quer usar o tratamento como possível desculpa para o ato ilícito cometido?”

Fundador do ABSex (Ambulatório de Transtornos da Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC), que atende gratuitamente portadores do transtorno pedofílico, Baltieri destaca que o tratamento não exime a pessoa de cumprir a pena dela na prisão: são procedimentos distintos.

Uma vez submetido a um médico, o profissional especializado vai verificar se de fato se trata de um pedófilo. Isto porque cerca de 80% dos molestadores ou estupradores de crianças não são pedófilos.

O transtorno pedofílico é caracterizado por fantasias, impulsos ou comportamentos intensos ou recorrentes sexualmente excitantes envolvendo adolescentes pré-púberes ou jovens, geralmente menores de 13 anos.

Baltieri explica que os pedófilos têm consciência dos crimes que cometem, mas que o prazer fala mais alto.

“Se a pessoa diz alguns dias depois de ser presa que está doente, já deve ter tido essa ideia antes. Por que não procurou o tratamento antes?”

Pornografia infantil é rotina

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O especialista afirma que cerca de 60% dos indivíduos que consomem pornografia infantil avançam para o ato sexual ou tentativa.

Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente é crime no Brasil, com pena de quatro a oito anos de prisão.

Na casa do professor, policiais apreenderam celulares, câmeras, computadores, discos rígidos e outras fontes de armazenamento de mídia.

Tratamento

A pedofilia não tem cura, mas pode ser controlada. O tratamento tem como objetivo fazer com que o indivíduo consiga ter uma vida sexual normal com adultos.

A contenção ou redução da impulsividade sexual anormal é feita com medicamentos e terapia, principalmente em grupo.

A prisão sem o tratamento médico adequado não é suficiente para que pedófilos não voltem a cometer os mesmos crimes. “Se ele for realmente portador do transtorno pedofílico, o risco de reincidência [após sair da cadeia] é altíssimo.”

O médico rejeita o que erroneamente se chama de “castração química”. Segundo ele, o termo dá a ideia ade algo dolorido, o que não é verdadeiro.

“Existe o tratamento hormonal, que pode ser aventado se o paciente quiser e se tiver indicação. Como o transtorno é mental, ele tem gravidades — desde o leve até o catastrófico, que resulta em estupro e morte. Em situações assim, o tratamento hormonal pode ser aventado. A medicação mudou nos últimos anos, com objetivo de reduzir impulso e com o prejuízo mínimo na libido. O objetivo é retomar a vida sexual com parceiro ou parceira da mesma idade.”

Baltieri observa que deixar o homem impotente não o impedirá de utilizar outras formas para atacar as vítimas. Porém, pedófilos costumam utilizar mais carícias, toques e brincadeiras, do que o ato sexual em si, de acordo com o médico.

No Brasil, não há lei em relação ao tratamento médico de pedófilos. “Nenhum especialista em sex offenders [criminosos sexuais] é contra a prisão. Deveria haver uma lei específica para predadores sexuais, para que realmente recebam a pena e o tratamento, caso padeçam do transtorno pedofílico”, ressalta o psiquiatra.

Por fim, ele recomenda às pessoas que tenham desejos sexuais envolvendo crianças e adolescentes que busquem ajuda.

“Não espere ser descoberto, nem chegar a consumir a pornografia. Procure o tratamento.”

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